Versificação
1 — Que é versificação?
R — Versificação é a arte de fazer versos.
2 — E o que é verso?
R — Verso é o nome que se dá a
cada linha da poesia. Essa linha sempre deve ter ritmo e certo número de
sílabas (é o metro). Eis exemplo de um verso:
"Minha terra tem palmeiras
Eis outro verso:
Onde canta o sabiá;
E mais outro:
As aves que aqui gorjeiam,
Ainda outro:
Não gorjeiam como lá."
(Gonçalves Dias)
3 — Se
verso é o nome de cada linha poética, como se chamarão os quatro versos juntos?
R — O conjunto de versos se chama
estrofe ou estância. A estrofe de 2 versos chama-se dístico; de 3, terceto;
de 4, quadra ou quarteto; de 5, quintilha;
de 6, sextilha; de 7, setilha (muito rara); de 8 oitava; de 9 (muito rara, não tem
designação própria); de 10, décima;
com mais de dez versos são raras. Quando o verso se repete no fim das estrofes,
temos o estribilho, muito comum no rondó e na balada.
4 — Verso
já entendi; e aquilo de ritmo e metro?
R — É que o verso deve ter metro, ritmo e rima. Destes, os
mais importantes são os dois primeiros: o metro e o ritmo.
5 —
Então, para que eu possa entender tudo muito bem, comecemos pelo metro.
R — O metro é a extensão da linha poética, é o número de sílabas do
verso. Na nossa língua, a poesia tradicional só admite versos de uma a doze
sílabas. Os poetas modernos, no entanto, já compõem versos com mais de doze
sílabas (são os chamados versos bárbaros).
As sílabas de um verso se denominam sílabas
métricas.
6 —
Sílaba?! Ah, isso eu já sei, é fácil!
R — Você sabe o que são sílabas gramaticais, mas estas são diferentes
das sílabas métricas. Nem sempre elas coincidem.
7 —
Então, como é que se faz a contagem das sílabas métricas?
R — A contagem das sílabas
métricas se faz auditivamente e
obedece a estes critérios:
1) quando houver vogal no fim de
uma palavra e vogal no início da palavra seguinte, formando ditongo (grande
amor) ou crase (minha alma) haverá uma só sílaba métrica;
2) no verso, a contagem de
sílabas métricas se faz somente até a sílaba tônica da última palavra.
Portanto, se a palavra for paroxítona, você não conta a última sílaba (por
exemplo: castelo); se for proparoxítona, as duas últimas sílabas são
desprezadas (por exemplo: lágrima). Os versos que terminam por palavras
oxítonas ou monossílabas são chamados agudos;
por paroxítonas, graves e por
proparoxítonas, esdrúxulos;
3) os ditongos crescentes, geralmente,
formam uma só sílaba métrica: pá-tria,
gló-ria, dei-xa, a-cor-dou, su-biu, lábios;
4) os hiatos mantêm, em geral, as
vogais separadas: ru-í-do, bo-a, re-cu-a, ven-ta-ni-a.
8 — Vamos
ver, na prática, como fica isso tudo?
R — Tomemos os versos já vistos. Dividindo-o
em sílabas métricas, fica:
"Minha terra tem palmeiras
"Mi
|
nha
|
ter
|
ra
|
tem
|
pal
|
mei
|
ras
|
1
|
2
|
3
|
4
|
5
|
6
|
7
|
Onde canta o sabiá;
"On
|
de
|
can
|
ta
|
o
|
sa
|
bi
|
á
|
1
|
2
|
3
|
4
|
5
|
6
|
7
|
As aves que aqui gorjeiam,
"As
|
a
|
ves
|
que
|
a
|
qui
|
gor
|
jei
|
am,
|
1
|
2
|
3
|
4
|
5
|
6
|
7
|
Não gorjeiam como lá."
"Não
|
gor
|
jei
|
am
|
co
|
mo
|
Lá"
|
1
|
2
|
3
|
4
|
5
|
6
|
7
|
Note que em todos os versos há
sete sílabas métricas e que a contagem destas só chega até a sílaba tônica da
última palavra do verso.
Escandir um verso é fazer o que
fizemos: dividi-lo em sílabas métricas.
9 — Se o
verso pode ter de uma a doze sílabas, é natural que cada um deles recebe nome
especial, não é?
R — Exatamente. Vejamos os nomes
dos mais comuns:
— versos de 5 sílabas chamam-se pentassílabos ou redondilhas menores;
— versos de 6 sílabas chamam-se hexassílabos;
— versos de 7 sílabas chamam-se heptassílabos ou redondilhas maiores;
— versos de 8 sílabas chamam-se octossílabos;
— versos de 9 sílabas chamam-se eneassílabos;
— versos de 10 sílabas são de
dois tipos: heróicos e sáficos;
— versos de 11 sílabas chamam-se hendecassílabos e
— versos de 12 sílabas chamam-se dodecassílabos ou alexandrinos.
10 — Veja o que estou pensando
agora: às vezes o poeta quer que na sua poesia os versos tenham... dez sílabas,
por exemplo. É fácil para que ele consiga isso?
R — Não, não é muito fácil, mas
os poetas podem recorrer a vários processos para que o metro seja perfeito. Eis
os principais:
— a crase: é a fusão de duas
vogais numa só: minha alma (mi-nhal-ma), pode exalar (po-de-xal-tar);
— a elisão: é a queda da vogal átona final de uma palavra, quando a
seguinte começa por vogal: canta um
(can-tum), minha infância (mi-nhin-fân-cia);
— a ditongação: é a fusão de uma vogal átona final com a seguinte,
formando ditongo: grande amor (gran-dia-mor), meigo amigo (mei-gua-mi-go);
— a sinérese: é a transformação de um hiato em ditongo: cru-el-da-de (cruel-da-de); vi-o-le-ta (vio-le-ta);
— a diérese: é a transformação de um ditongo em hiato: sau-da-de (sa-u-da-de), vai-da-de (va-i-da-de);
— a ectlipse: é a queda de um fonema nasal final para que haja crase ou
ditongação: com o (co), com os (cos), com a (côa), com as (côas);
— a aférese: é a queda de sílabas ou fonema inicial: inda (em vez de ainda), stamos (em vez de estamos).
11 — Parece
que já vimos tudo sobre metro. Passemos, então, ao ritmo do verso.
R — O ritmo é a música do verso. Para que um verso tenha ritmo, usam-se sílabas
fortes e sílabas fracas, com intervalos regulares. A sequência rigorosa dessas
sílabas é que dá ao verso música, harmonia e beleza. Quando se fala em ritmo,
há um verso que merece especial atenção: é o decassílabo.
12 —
Desculpe-me, mas já me esqueci disso. Que é mesmo verso decassílabo?
R — Verso decassílabo é aquele que tem dez sílabas métricas. Nesses versos, o
acento pode estar na 6ª e 10ª sílabas (é o verso heroico) ou na 4ª, 8ª e 10ª sílabas (é o verso sáfico).
13 —
Vamos então separar as sílabas métricas de cada um para ver?
R — Eis o verso heroico (acentos na 6ª e 10ª sílabas):
"Só a le ve es pe ran ça em to da a vi da.
(Vicente de Carvalho)
Agora, o verso sáfico (acentos na 4ª, 8ª e 10ª
sílabas):
"Dis far ça a pe na de vi ver, mais na da."
(Vicente de Carvalho)
Não juntamos as sílabas do verso heroico (só a), porque a sílaba termina por vogal tônica, razão pela qual
não se deve juntá-la à seguinte.
14 — Só
os versos decassílabos é que são importantes? Não há outro que mereça pelo
menos uma citação?
R — Os realmente importantes
(porque mais aparecem e ficaram famosos com "Os Lusíadas") são os
decassílabos. Mas não podemos esquecer os versos de doze sílabas ou alexandrinos.
Estes podem ter acentos na 6ª e 12ª sílabas (é o verso alexandrino clássico) ou
na 4ª, 8ª e 12ª sílabas (é o alexandrino moderno).
Exemplo de alexandrino clássico:
"Tu fos te co mo o sol u ma fon te de vi da"
(Olavo Bilac)
Exemplo de alexandrino moderno:
"É o cho ro sur do en tre cor ta do do ba tu que"
(Cassiano Ricardo)
Note a 1ª sílaba métrica desse
verso: (É o), um recurso usado pelo autor.
15 — E a
rima? Ê importante haver rima num verso?
R — Rima é a identidade ou semelhança dos sons no meio ou no final dos
versos.
16 — E os
versos que não rimam como se chamam?
R — Versos que não rimam são
chamados versos brancos ou versos soltos.
17 — Que mais sobre rima?
R — As rimas podem ser
classificadas de acordo com seu valor em:
— pobres: quando formadas entre palavras de mesma classe: amor e louvor (ambas são substantivos); olhar e calar (são
verbos);
— ricas: quando formadas entre palavras de classes diferentes: arde e covarde (uma é verbo; outra, adjetivo); penas e apenas (uma é
substantivo; outra, advérbio);
— preciosas: quando se usam três palavras para formar a rima: vê-la e estrela; vê-lo e novelo;
— raras: quando formadas com palavras que dificilmente rimam com
outras: cisne e tisne, estirpe e extirpe (são raras ás palavras que assim terminam e possam rimar).
18 — A s
rimas recebem nomes especiais, quanto ao lugar que ocupam na estrofe?
R — Quanto ao lugar que as rimas
ocupam na estrofe, podem ser:
1) cruzadas ou alternadas: abab. Exemplo:
"De muita gente que existe, a
Que nós julgamos ditosa, b
Toda a ventura consiste, a
Em parecer venturosa." b
(Esta quadra é de origem popular,
mas semelhante no significado à última estrofe do soneto "Mal
secreto", de Raimundo Correia.)
Note como são cruzadas: um verso
não rima com o seguinte, mas com o posterior a este.
2) emparelhadas: aabb. Exemplo:
"Uma noite estendi a música
na estante a
E o cravo suspirou... Naquele
mesmo instante, a
Da ebúrnea palidez doentia do teclado b
Manso e manso evolou-se o aroma do passado. b
(Gonçalves Crespo)
Note que as rimas são paralelas,
aparecem aos pares, uma logo depois da outra.
3) interpoladas ou opostas: abba. Exemplo:
"Pinta-me a curva destes
céus... Agora, a
Ereta ao fundo, a cordilheira apruma: b
Pinta as nuvens de fogo de uma em
uma, b
E alto, entre as nuvens, o raiar
da aurora." a
(Olavo Bilac)
Observe que nas rimas
interpoladas, os versos extremos é que rimam, havendo entre eles rimas
emparelhadas.
4) encadeadas: quando o fim de um verso rima com o meio do seguinte. Exemplo:
"Voai, zéfiros mimosos
vagarosos, com cautela."
(Silva Alvarenga)
5) Se na poesia nenhum desses
casos houver, as rimas são chamadas misturadas. Por exemplo:
"No outono a luz é um eterno
poente, a
Que mais à calma que ao rumor se
ajeita; b
Brilha.
d
Tão de manso e calma, c
Que parece unicamente feita b
Para o estado d'alma c
De um convalescente." a
(Mário Pederneiras)
---
Fonte:
Português... bem mais fácil, por: Luiz Antônio Sacconi. Editora Atlas. São Paulo, 1972,m págs. 252-257.
Fonte:
Português... bem mais fácil, por: Luiz Antônio Sacconi. Editora Atlas. São Paulo, 1972,m págs. 252-257.
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