Miguel Torga
(1907)
Miguel Torga
é o pseudônimo de um dos mais apreciados escritores portugueses deste século.
Seu nome real é Adolfo Correia Rocha, e já esteve no Brasil, país que ele muito
admira. Escritor de brilhante estilo, seguindo os velhos moldes lusitanos,
daquela geração que tanto ilustrou o velho Portugal, Miguel Torga escreve de
maneira bastante amena, beirando por vezes as raias do classicismo. Suas
histórias descrevem-nos personagens do povo, do campo, dos humildes, mas
atingindo frequentemente forte realismo, como no conto Mariana, que
selecionamos para esta coletânea. Trata-se de cenas passadas em um povoado de
gente rude, nas montanhas lusitanas, onde se juntam o atraso e a superstição,
fato comum, em todos os países onde a educação ainda não pôde extirpar tais
práticas. Mariana figura em Novos Contos
da Montanha, editado pela Coimbra Editora, em 1945, já em segunda edição.
Miguel
Torga, por causa de sua ideias corajosas, nem sempre foi benquisto pelo seu
governo atual, ou melhor, pelos senhores do regime. Contristado com o que vai
por lá e também pelo mundo, externa sua mágoas no prefácio do livro em apreço,
nestes termos: "Querido leitor: Escrevo-te da Montanha, do sítio onde
medram as raízes deste livro. Encontrei tudo como o deixei no ano passado,
quando da primeira edição destas aventuras. Apenas vi mais fome, mais
ignorância, e mais desespero. Corre por estes montes um vento desolador de
miséria que não deixa florir as urzes nem pastar os rebanhos, o social
juntou-se ao natural, e a lei anda de mãos dadas com o suão a acabar de secar
os olhos e as fontes. Crestados e encarquilhados, os rostos dos velhos pastores
parecem pergaminhos milenários onde uma pena cruel traçou fundas e trágicas legendas.
Na cara lisa dos novos, pouco mais esperança há. Ora, eu sou escritor, como
sabes. Poeta, prosador, é na terra redonda que têm descanso as minhas
angústias".
Sente-se
humilhado ante tanto surro e tanta lazeira e envergonhado de representar o
ingrato papel de "cronista de um mundo que nem me pode ler".
As histórias
de Miguel Torga são quase dolorosas, mas verossímeis, pois representam um retrato fiel
do sofrimento humano e da miséria que grassam em sua terra, e pede a
compreensão do leitor pela sorte áspera de seus irmãos.
A bagagem
literária de Miguel Torga é considerável, como x pode verificar.
Poesia: Ansiedade (1928, fora do mercado), Rampa (1930). Tributo (1931), Abismo
(1932), O Outro livro de Job (1936
2.a edição! 1944), Lamentação (1942).
Prosa: Pão ázimo (1931), A terceira voz (1934), A criação do mundo (— os dois primeiros
dias (1937), O terceiro dia da criação do
mundo (1938), O quarto dia da criação
é a mundo (1939), Bichos (1940,
1943 e 1944), Montanha (1941), Um reino maravilhoso (Trás-os-Montes),
conferência ,1914), Rua (1912). O Senhor Ventura (1943), O Porto, conferência
(1944), Vindima (1945). Teatro: Terra firme (1941). Poesia e prosa: Diário (1.° volume: 1941 e 1942). Diário (2.° volume, 1943). Edições do
Autor: Novos contos da montanha (1944
e 1945), Libertação (1944), Diário
(3.° volume), Poemas ibéricos e O quinto aia da criação do mundo.
Como se vê,
Miguel Torga exercitou vários gêneros, tendo sobressaído em todos. É um
escritor que se lê sempre com prazer e que nos faz meditar ante os temas
humanos e dolorosos que nos apresenta, quase sempre fruto de uma dura
realidade.
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Fonte:
Primores do Conto Universal: Contos Portugueses. Seleção e organização: Jacob Penteado. Editora EDIGRAF. São Paulo, s/d, págs. 263-264.