As Seitas Judaicas — No fim deste
período apareceram na Judéia diversas seitas, sendo as principais a dos
Fariseus, a dos Saduceus e a dos Essênios. Esta última, ainda que não seja
mencionada pelo nome no Novo Testamento, exercia uma certa influência na vida religiosa
daqueles tempos.
Os Fariseus eram os sucessores espirituais
dos Hasideanos, ou Casidins, "homens poderosos de Israel, oferecendo-se de
boa vontade pela Lei", 1 Mac. 2:42. Desejavam vivamente conservar a nação
fiel às tradições do passado. Mas quando Jônatas, o filho de Matatias,
principiou a mostrar outro propósito na luta, não sendo já movido pela causa de
Deus, mas pelos seus próprios interesses, e quando Simão foi escolhido pelo
povo para seu sumo sacerdote, os escribas e os hasideanos retiraram-se do
partido dos Macabeus. "Não pode haver dúvida alguma", diz Wellhausen,
de que sob o ponto de vista legal eles tinham muita razão em se contentarem,
como fizeram, com a conquista da liberdade religiosa. Os hasmoneus não tinham
direito hereditário ao sumo sacerdócio, e a sua política que aspirava ao
estabelecimento duma monarquia nacional, era inteiramente contrária ao espírito
e essência da segunda teocracia". Foi uma profunda aderência à antiga
constituição mosaica que produziu uma completa ruptura entre João Hircano, neto
de Matatias e os fariseus. Num banquete político disse um fariseu a Hircano que
ele devia resignar o seu lugar de sumo sacerdote e tratar simplesmente do
governo civil do povo.
Significação do nome — Os fariseus, ou
"separatistas", foram assim chamados, provavelmente pelos seus
inimigos, para indicar o seu exclusivismo em face do povo em geral, o
"povo da terra". A separação era realmente essencial ao ideal
farisaico da vida religiosa. A Lei, como era exposta pelos escribas, era tão
minuciosa que se tornava impossível aos judeus em geral o guardá-la
perfeitamente. Os fariseus eram os homens que, unidos aos escribas, aceitavam
os seus ensinamentos, consistindo a sua principal tarefa em pô-los em prática.
Diz a seu respeito o Deão Stanley: "Eles por princípio e por política
multiplicavam os sinais exteriores, que os deviam distinguir do mundo
gentílico, ou mesmo dos do seu país, já manchados de gentilismo. Borlas nos
seus vestidos; rolos e pequenos receptáculos de couro presos à testa, à cabeça
e ao pescoço, com textos da Lei; longas orações feitas em praças públicas:
abstinência rigorosa; imersões constantes; tudo isto eram as insígnias
sacramentais, de que faziam uso, para mostrarem a sua superioridade". Não
se pense todavia, que os pensamento-e vidas dos fariseus eram inteiramente
consagrados às ordenações externas. Importa lembrar que eles procuravam
conservar viva a esperança da vinda do Messias, e que, se muitas vezes
deturpavam a verdade, não deixavam de proclamar que Deus recompensaria a obediência
à Lei: eles confortavam aqueles que sofriam na sua defesa com a segurança de
que haviam de possuir a vida eterna, e iam advertindo os maus üi que as suas
maldades haviam de ter uma retribuição correspondente por toda a eternidade.
Entre todas as seitas judaica a dos fariseus, embora não fosse a mais numerosa,
era na verdade a mais proeminente, a mais popular, e a mais nacional em
espírito. O patriotismo era o seu ponto de partida, e a restauração do governo
divino era o seu objeto; apesar disso, como o farisaísmo não avaliava os homens
pelos seus sentimentos, mas somente pelas exterioridades, ele foi severamente
denunciado por Jesus Cristo, que por isto mesmo contava entre os fariseus os
seus maiores inimigos.
Os Saduceus, o grande partido rival dos
fariseu receberam o seu nome, ou de Zadoque, o sumo sacerdote, meado por
Salomão (1 Reis 2:35) ou "porque pretendiam eu oposição aos meros partidos
do separatismo, ser os verdadeiros Rsadiquins, os homens retos que insistiam
mais na prática da moral do que no cumprimento da Lei cerimonial". Eles
negavam a autoridade da tradição, e consideravam suspeitas as revelações
posteriores a Moisés. Faziam objeção a todo o desenvolvimento da verdade
divina, tratando-se mesmo de princípios plenamente subentendidos no Pentateuco,
e desta forma muitas vezes compreendiam mal os próprios livros que declaravam
receber. E então chegavam a negar as doutrinas da ressurreição e da
imortalidade da alma. Com respeito a negarem eles a existência de anjos e
espíritos, como se lê em Atos 23:8, isso não pode ter outra explicação, senão a
de que quando os homens se tornam cépticos, a incredulidade está intimamente
ligada à sua credulidade. Os preceitos da Lei eram as únicas partes do
Pentateuco que eles consideravam claras, tudo mais era para eles incerto.
Relativamente à esperança messiânica, eram eles profundamente indiferentes. Os
saduceus na sua maior parte eram pessoas de alta posição e riqueza. A partir do
tempo de João Hircano vemos que eles ocuparam muitas vezes o lugar de sumo
sacerdote. Anás e o seu genro Caifás, que presidiram o julgamento de Cristo,
eram saduceus. Dá-nos uma ideia clara do dogmatismo desta seita o fato de que
eles excederam os fariseus na perseguição dos apóstolos, que "ensinavam ao
povo e pregavam, por Jesus Cristo, a ressurreição dos mortos".
Os Essênios — A reserva dos escritores
do Novo Testamento a respeito da terceira das grandes seitas que neste período
apareceram na Judéia, é realmente notável, visto como alguns dos seus pontos
característicos estão em íntima relação com os ensinamentos de João Batista e
mesmo de Jesus Cristo. O essenismo era uma reação contra as formalidades
mecânicas em que o farisaísmo assentara. Os seus partidários não tomavam parte
alguma nos negócios públicos, e passavam a vida em lugares retirados e
solitários, onde nas ocupações da agricultura, por meio de hábitos ascéticos,
pelo celibato, e pelas abluções e orações, eles procuravam realizar o seu ideal
de pureza levítica. À exceção dum juramento solene quando eram iniciados na sua
seita, os essênios abstinham-se de jurar, desprezavam as riquezas e
manifestavam a maior aversão pela guerra e pela escravidão. Todavia, embora
ciosos da Lei, transgrediam-na também rejeitando os sacrifícios de animais, e
adorando o sol. Em matéria de crença eles seguiam as Escrituras, e tinham por
elas o maior respeito, interpretando-as, contudo, segundo um sistema alegórico
inteiramente seu; acreditavam também na
imortalidade da alma, mas não aceitavam a doutrina da ressurreição dos corpos.
Posteriormente
ao tempo de Jesus Cristo estas seitas foram conhecidas por diferentes nomes. Os
fariseus foram sucessivamente chamados rabinistas (discípulos dos rabis, ou
grandes mestres), cabalistas (isto é, tradicionalistas) e talmudistas. Os que
sustentavam a doutrina dos saduceus sobre a supremacia do texto literal do
Pentateuco, embora não abraçassem os seus outros erros, foram chamados caraítas
ou escrituristas. Os essênios também são conhecidos na história pelo nome de
terapeutas (isto é. médicos da alma), ainda que alguns pensem que este nome
pertencia aos sequazes duma seita inteiramente distinta, posto que semelhante.
Para maior conhecimento do assunto desta secção, vejam-se os capítulos sobre
fariseus, saduceus e essênios na obra de Schürer Jewish People in the time of Christ, parte II, vol. II; e o
capítulo sobre as Comunidades Religiosas da Terra Santa, no vol. I de Jesu van Nazara, do escritor Keim. E
especialmente sobre os essênios, leia-se a dissertação do Bispo Lightfoot no
seu Commentary on Colossians, e as
conferências do Dr. H. R. Reynolds sobre João Batista.
Devemos
observar que se os fariseus faziam uso da tradição na descoberta da verdade, os
saduceus empregavam para o mesmo fim, a lógica racionalista, como em tempos
posteriores vieram a fazer os filósofos escolásticos; e também que estas seitas
tiveram a sua origem nas tendências da natureza humana e na decadência da
religião espiritual. Mas a grande questão entre aqueles era a extensão e
autoridade da tradição. Os saduceus embora quisessem comparar a tradição com a
parte da Escritura que aceitavam, negavam a sua autoridade, ao passo que os fariseus
recebiam-no como divina.
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Fonte:
História, doutrina e interpretação da Bíblia - Volume II, por: Joseph Angus. Tradução: J. Santos Figueiredo. Casa Publicadora Batista. Rio de Janeiro, 1953, págs. 197-200.
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