A Bíblia e o quadro negro
Igreja Presbiteriana cresceu investindo no
evangelismo e na educação
O pioneiro
Simonton: vida a serviço da obra missionária
Todo mundo
já ouviu o célebre ditado "o tempo voa". Para a maioria das pessoas,
a vida passa sem dar-lhes oportunidades de deixar sua existência marcada neste
mundo. Ou, pelo menos, elas se queixam disso. Ao longo da história, não foram
muitos os que souberam utilizá-lo como aliado, vivendo cada minuto como se
fosse o último. Mas, pessoas assim existiram. O próprio Jesus Cristo deu
exemplo: só precisou de três anos para registrar na História uma participação
tão marcante que acabou dividindo-a em duas partes, antes e depois dele. Mais
tarde, vieram outros, inclusive alguns que, procurando viver à imagem e
semelhança do Filho de Deus, fizeram do seu tempo o melhor uso possível,
vivendo para divulgar a mensagem do Mestre. O pastor e missionário americano
Ashbel Green Simonton pode ser incluído nesta categoria. Em apenas oito anos,
ele aprendeu tudo o que podia sobre a Palavra de Deus, viajou para o Brasil,
anunciou o Evangelho para pessoas que nunca tinham ouvido falar da salvação em
Cristo e morreu deixando como herança uma das maiores igrejas protestantes em
território nacional. Hoje, passados 138 anos da chegada de Simonton ao país, a
Igreja Presbiteriana do Brasil tem mais de 1.700 igrejas e quase dois mil
pastores espalhados pelo país. É o grupo evangélico que mais investiu em
educação no Brasil, possuindo até hoje uma grande rede de escolas em todos os
níveis de ensino. Isso sem falar nos quase l milhão de fiéis vinculados aos
quatro grandes grupos em que se dividem hoje os presbiterianos.
Desde cedo,
Simonton, nascido em West Hanover, no estado da Pensilvânia, em 20 de janeiro
de 1833, demonstrou interesse incomum pela obra missionária. Assim que concluiu
o Seminário Presbiteriano de Princeton e tornou-se pastor, não hesitou em fazer
as malas e partir rumo ao Brasil. A decisão, totalmente inusitada, deveu-se a
uma revelação que Simonton interpretou como a vontade de Deus na sua vida.
Depois de longa viagem de navio, aportou no Rio de Janeiro em 1855 onde logo
manteve contato com c médico escocês Robert Kalley. Esse "estágio"
com o pioneiro do Evangelho em terras fluminenses foi mais do que providencial:
além da comunhão e do aprendizado espiritual. Simonton, que tinha apenas 26
anos. pôde conhecer bastante sobre a sua "terra prometida". Como
quase todos os estrangeiros na época, ele pouco mais sabia sobre o Brasil além
do fato de aqui haver florestas e muitos índios. Kalley já desenvolvia um
trabalho protestante na cidade, apesar das dificuldades culturais e da forte
resistência católica. Foi o que bastou para encorajar o jovem missionário.
Escravidão
Não demorou
muito e Simonton começou a andar com as próprias pernas, mas sempre pela fé. No
dia 19 de maio de 1861, conseguiu sua primeira vitória, Com a ajuda do pastor
Alexander Blackford, seu cunhado, o pioneiro alugou uma sala na rua do Ouvidor,
no centro da então capital do Império. O preço, 50 mil réis, era bastante salgado na época, mas Simonton contou
com a ajuda financeira de um grupo de americanos que ali passaram a realizar
culto; em inglês. A iniciativa valeu a pena. De acordo com a historiadora Leila
Menezes Duarte, especialista na história do protestantismo no Rio de Janeiro,
naquele imóvel realizou-se o primeiro culto ministrado em português realizado
em local público. "O âmbito doméstico era a única forma de culto permitida
pela constituição do império para os protestantes no Brasil", informa a
pesquisadora. Na verdade, o culto tinha o objetivo principal de estudar a
Bíblia, e essa primeira reunião contou com apenas duas pessoas. Mas o otimista
Simonton teve seus esforços recompensados. Três domingos depois, a sala já
ficou cheia de brasileiros interessados em estudar a Palavra de Deus junto com
os missionários presbiterianos. Logo as reuniões de estudo bíblico tornaram-se
evangelísticas. Os frutos não tardaram e, no dia 12 de janeiro de 1862,
Simonton realizou o batismo dos dois primeiros convertidos, um padeiro português
chamado Camilo e o brasileiro Serafim, que trabalhava como carpinteiro. Aquela
data acabou tornando-se histórica, passando a marcar a fundação da Igreja
Presbiteriana do Rio de Janeiro, a primeira da denominação no Brasil. O
crescimento da obra na sala da rua do Ouvidor levou Simonton e seus seguidores
a instalar-se num terreno da Travessa da Barreira (atual rua Silva Jardim). O
local abriga até hoje a Catedral Presbiteriana do Rio de Janeiro.
A expansão
da missão de Simonton logo adaptou-se à realidade brasileira. Inclusive, num
ponto polêmico: a escravidão. Apesar de ser fervoroso antiescravista, Simonton
não tocava no assunto em suas mensagens. A Junta de Missões Estrangeiras,
responsável pela missão no Brasil, temia um confronto com a classe dirigente
brasileira, em sua maioria defensora da escravatura, o que poria em risco o
apoio político e ideológico conseguido para seus missionários. Tal
característica persistiu até a proclamação da República, em 1889, o que
originou um fato curioso: não havia representantes das duas classes que
compunham a base e o pico da pirâmide social do país - os escravos e a
aristocracia - na igreja.
Vencidos os
primeiros obstáculos no Rio de Janeiro, Simonton se dirigiu para o Estado de
São Paulo, organizando no ano de 1865 a Primeira Igreja Presbiteriana da
capital paulista. Preocupado em expandir o protestantismo num país onde o
catolicismo perseguia qualquer um que se atrevesse a mudar o discurso
religioso, Simonton foi surpreendido pela providência divina. Um ano após a
fundação da igreja em São Paulo, nascia uma congregação na cidade de Brotas, no
interior paulista. Não haveria nada demais neste fato, exceto que houve a ajuda
decisiva de um ex-padre convertido ao protestantismo, José Manoel da Conceição.
Sacerdote controvertido, ele já aborrecia os bispos católicos mesmo antes da
sua conversão, quando estimulava seus párocos a lerem a Bíblia. Figura
fundamental na expansão da igreja, Manoel, além de realizar frequentes cruzadas
no Rio e em São Paulo, fazia questão de visitar a população do interior, não
passando por nenhuma fazenda ou casa pobre sem orar e ler a Bíblia com os
moradores. Através da influência do ex-padre, as antigas paróquias católicas interioranas
acabaram se transformando em igrejas evangélicas. O crescimento acelerado,
contudo, não pôde ser presenciado pelo pioneiro Simonton, que morreu em 1867,
em São Paulo, com apenas 34 anos de idade, vítima da febre amarela - moléstia
tropical que fez milhares de vítimas no fim do século 19.
Fé na educação
Com o passar
dos anos e a consolidação da denominação em território nacional, os
presbiterianos começaram a engajar-se na realidade social brasileira. No início
deste século, a maioria da população brasileira era formada por analfabetos.
Sob o ponto de vista espiritual, esse fato era um desastre: significava uma
multidão de pessoas sem acesso às doutrinas e ensinos bíblicos. Atentos a esse
drama que afetava milhões de brasileiros, a igreja resolveu investir
maciçamente em educação. A filosofia era simples, mas eficaz, e era traduzida
no slogan: "Ao lado de cada igreja, uma escola". O sucesso foi total.
"O grande interesse pela educação fez com que os presbiterianos criassem
inúmeras instituições de
ensino, algumas respeitadíssimas até hoje", diz o professor Cléber
Selos, 37 anos, que leciona história da igreja no Seminário Presbiteriano do
Rio. Além do Instituto Presbiteriano Mackenzie, em São Paulo, a maior
universidade particular da América Latina, os presbiterianos possuem ainda 500
templos-escola, que ministram ensino da pré-escola ao 2- Grau. "Temos
desafiado as igrejas a usar os espaços vazios para dar cursos de alfabetização,
ou mesmo profissionalizantes para crianças e adultos", conta o pastor
Guilhermino Cunha, que há três anos preside o Supremo Concílio da Igreja Presbiteriana
do Brasil, a maior das quatro convenções da denominação no país. Além da
preocupação em manter a dedicação das igrejas pelo ensino, Guilhermino objetiva
uma reaproximação com as
outras vertentes da igreja em território
nacional: Igreja Presbiteriana Unida (IPU), a Igreja
Presbiteriana Independente (IPI) - e Igreja Presbiteriana Conservadora (IPC),
que juntas representam cerca de 30% do - total de presbiterianos no país. Mas eles
não estão atentos apenas à educação. O
pastor Guilhermino salienta que o objetivo da igreja é implantar pelo menos uma
congregação por semana. "Temos conseguido alcançar este alvo, que faz
parte da nossa grande meta de dobrar o número de evangélicos presbiterianos no
país até o ano 2000." Esse empenho missionário mostra que os ideais de
Ashbel Simonton continuam delineando as prioridades da Igreja Presbiteriana do Brasil até
hoje.
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Fonte:
Revista Vinde. Ano II - Nº 22 - Setembro de 1997. Editora Vinde. Rio de Janeiro, págs. 56-58.
Fonte:
Revista Vinde. Ano II - Nº 22 - Setembro de 1997. Editora Vinde. Rio de Janeiro, págs. 56-58.
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