Contradições
nos escritos de Ellen G. White?
Sindicatos
e casamento de negro com branco
Numa
série de artigos, a revista Defesa da Fé, do Instituto Cristão de Pesquisas,
fala sobre "heresias e contradições nos escritos de Ellen G, White".
A Casa Publicadora Brasileira, valendo-se do direito de resposta, preparou um
artigo que deverá ser publicado na referida revista. A seguir, o teor da
matéria:
A série "Heresias e Contradições nos
Escritos de Ellen G. White", de autoria de Sérgio Quevedo, foi introduzida
como sendo o resultado de "uma investigação científica nos escritos de
Ellen G. White" (Defesa da Fé, outubro/dezembro
de 1996, pág. 23). Lamentavelmente, porém, essa pretensão não transparece no
próprio conteúdo da série, como bem evidente na interpretação que o referido
autor faz das declarações da Sra. White.
Uma das características fundamentais do
método científico de análise literária é que todas as declarações do autor
sobre o assunto a ser estudado devem ser cuidadosamente consideradas,
levando-se l em conta o contexto sócio-1 político e religioso em que foram
escritas. Além disso, nenhum erudito que se preza está justificado a
desconhecer as pesquisas prévias mais relevantes sobre o assunto, mesmo que ele
não concorde com elas.
Uma breve análise do conteúdo da série acima
mencionada é suficiente para demonstrar: 1)
que o seu autor não usou o método científico de análise literária, mas
simplesmente emitiu sua própria opinião pessoal sobre as declarações abordadas;
2) que ele, ao invés de levar em
consideração todas as declarações de Ellen G. White sobre os respectivos temas,
valeu-se, de forma seletiva e descontextualizada, apenas de algumas citações; e
3) que ele falhou, consequentemente,
em suas interpretações do que a Sra. White realmente queria dizer nas
declarações consideradas. A fim de não gastarmos muito espaço deste periódico,
consideraremos apenas dois exemplos, representativos da tendência geral da
série, encontrados na revista Defesa da
Fé de maio/junho de 1998.
O primeiro exemplo diz respeito à maneira
tendenciosa como Sérgio Quevedo interpreta certa declaração de Ellen White,
desaprovando casamentos mistos. Se a série em discussão é o resultado de
"uma investigação científica", como prometido aos leitores, por que
então o seu autor não mencionou absolutamente nada a respeito da época e das
circunstâncias em que foram escritas as declarações de Ellen White sobre o
assunto?
Por que nada é dito sobre as fortes tensões
raciais americanas do século XIX, que ainda não foram completamente superadas?
Por que nada é dito a respeito da marginalização social dos filhos de tais
casamentos? Por que nenhuma alusão é feita às obras mais relevantes sobre o
assunto? Se a série tem pretensões científicas, não há escusa para o autor haver
desconhecido obras como as de Ronald D. Graybill, E.G. White and Church Race Relations (Washington, DC: Review and Herald, 1970); Ciro
Sepúlveda, ed., Ellen White on the Color
une: The Idea of Race in a Christian Community (S.I.: Biblos, 1997). É lamentável que o autor não conseguiu
perceber que a intenção de Ellen White não era fortalecer os preconceitos
raciais da época, mas simplesmente incentivar a formação de lares livres dessas
tensões raciais e garantir a felicidade social dos filhos!
O segundo exemplo que julgamos oportuno
considerar diz respeito às declarações de Ellen White sobre o envolvimento dos cristãos
nas lutas trabalhistas americanas do século XIX. Por que mais uma vez o autor
optou por deixar os seus leitores em completa ignorância do contexto sociopolítico
e econômico americano da época? Por que nenhuma distinção é feita entre os
sindicatos bem organizados de hoje? Por que nenhuma alusão é feita ao fato de
que várias greves sindicais da época, caracterizadas por forte violência,
simplesmente prejudicaram a própria causa dos trabalhadores, em vez de
beneficiá-la? Além disso, por que o autor não mencionou as atitudes das demais denominações
"evangélicas", na época, para com esses mesmos sindicatos? Uma
abordagem científica do assunto não poderia haver desconhecido também o
clássico artigo do Dr. Carlos A. Schwantes, professor de História na
Universidade de Idaho, intitulado "Labor Unions and Seventh-day
Adventists: The Formative Years, 1877-1903, "Adventists Heritage" (inverno
1977): 11-19- Mais uma vez Sérgio Quevedo não conseguiu perceber que a intenção
de Ellen White não era tolher os direitos dos trabalhadores, mas simplesmente
incentivá-los a assegurar seus direitos de forma pacífica, sem o uso da
violência, característica das greves sindicais da época. É por essa razão que a
Igreja Adventista não proíbe seus membros de se vincularem aos sindicatos
modernos, mas apenas os orienta a não desconhecerem os princípios da
não-violência ensinados por Cristo (ver Mat. 5:38-42).
Especialistas em análise literária e/ou
hermenêutica bíblica poderão acabar questionando se deveriam encarar os
problemas hermenêuticos da série "Heresias e Contradições nos Escritos de
Ellen G. White" como restritos apenas às críticas que Sérgio Quevedo faz
aos escritos da Sra. White, ou se deveriam entendê-los como um padrão
hermenêutico que o autor costuma usar inclusive em suas interpretações das
Escrituras!...
Desconhecendo o contexto da época, alguém
poderia acusar o próprio apóstolo Paulo de discriminação sexual, ao ordenar que
as mulheres ficassem caladas na igreja (ver I Cor. 14:34 e 35). Isso confirma
mais uma vez o princípio básico de que, para conhecermos o pensamento de um
autor (inclusive de Ellen White), não podemos confiar meramente nas opiniões
dos seus apaixonados advogados ou dos seus acérrimos inimigos, mas devemos
estudá-los por nós mesmos, para ver se as coisas são "de fato, assim"
(ver Atos 17:11).
---
Fonte:
Revista Adventista, agosto de 1998. Casa Publicadora Brasileira, págs. 32-33.
Nenhum comentário:
Postar um comentário