A última música do Titanic
O relógio do
enorme e luxuoso salão de baile marcava menos de duas horas da madrugada da
noite de 14 para 15 de abril de 1912. Todo mundo estava acordado. Os escaleres
apinhados de mulheres e crianças da primeira classe já haviam descido. Vários
passageiros já haviam pulado para a água gelada do mar. Alguns já haviam
morrido por causa do impacto da queda e seus corpos boiavam ao redor do navio.
A noite estava serena e o mar também. Foi quando um dos violinistas, já no
convés do Titanic, entre gritos de
desespero, começou a tocar um dos mais ternos hinos religiosos, no que foi
imediatamente acompanhado por outros violinos, viola e violoncelo. Talvez
ninguém, naquela altura, tenha cantado ou cantarolado a conhecida letra da
conhecida música. Mas, tanto uma como a outra, deve ter soado gostoso aos
ouvidos de todos os que ainda estavam a bordo, antes de o navio se partir em
dois e afundar de vez. Era pelo menos um pequeno conforto para quem não
conseguiu lugar num dos botes salva-vidas e estava a apenas um passo da morte
certa e pavorosa. Era também — quem sabe — uma confissão de última hora, para
compensar a desatenção coletiva dada a Deus até então e a soberba daquele
passageiro incontido que achava e declarou em público que nem Deus podia
afundar o Titanic. Pois todos que
ouviram a melodia certamente se lembraram no mínimo do título do hino: Nearer, my God, to Thee (Mais perto, meu Deus, de ti).
Não era a
primeira vez que o hino Mais perto, meu
Deus,, de ti entrava para a história. Dois anos antes, em 1910, por ocasião
da Convenção Mundial de Escolas Dominicais, realizada em Washington, ele foi
cantado em 23 idiomas. E, em 1872, 40 anos antes, 50.000 pessoas o entoaram na
celebração do Jubileu da Paz, na cidade de Boston.
---
Fonte:
Revista Ultimato. Ano XXXI - Nº 252 - Maio de 1998. Editora Ultimato. Viçosa - MG, pág. 27.
Nenhum comentário:
Postar um comentário