Tensão entre o Galuth e o Regresso
Depois da
destruição do Primeiro Templo, Jeremias convenceu-se de que o Exílio não
terminaria imediatamente. Aconselhou o povo judaico, pois, a que se habituasse
à condição de que duraria algumas gerações e a que se dedicasse à vida civil da
Babilônia. Seis séculos mais tarde, depois da destruição do Segundo Templo, a Babilônia
depressa se tornou num maior centro de população judaica e de cultura judaica
do que a Palestina. Existem ecos, por conseguinte, nos escritos rabínicos da
noção de que a Babilônia é um local tão bom para o judeu viver quanto a
Palestina. Os rabis medievais silenciaram a sua consciência ao não cumprirem o
mandamento de ir para a Terra Santa, salientando a dificuldade da viagem e o
fato de que as leis do tributo e outras obrigações semelhantes que se aplicavam
à Terra Santa já não podiam ser obedecidas.
Assim diz o
Senhor dos Exércitos, o Deus de Israel, ,a todos os exilados, que Eu deportei
de Jerusalém para a Babilônia: Edificai casas, e habitai nelas; plantai
pomares, e comei o seu fruto. Tomai esposas e gerai filhos e filhas, tomai
esposas para vossos filhos e dai vossas filhas a maridos, para que tenham
filhos e filhas; multiplicai-vos aí, e não vos diminuais. Procurai a paz da
cidade, para onde vos desterrei, e orai por ela ao Senhor; porque na sua paz
tereis paz. Porque assim diz o Senhor dos Exércitos, o Deus de Israel: Não vos
enganem os vossos profetas que estão no meio de vós, nem os vossos adivinhos,
nem deis ouvidos aos vossos sonhadores que sempre sonham segundo o vosso desejo,
porque falsamente vos profetizam eles em Meu 'nome; Eu não os enviei, diz o
Senhor. Assim, diz o Senhor: Logo que se cumprirem para Babilônia setenta anos
atentarei para vós e cumprirei para convosco a Minha boa palavra, tornando a
trazer-vos para este lugar. Eu é que sei que pensamentos tenho a vosso
respeito, diz o Senhor: pensamentos de paz, e não de mal, para vos dar o firn
que desejais. Então Me invocareis, passareis a orar a Mim e Eu vos ouvirei.
Buscar-me-eis e Me achareis, quando Me buscardes de todo o vosso coração, diz o
Senhor, e farei mudar a vossa sorte; congregar-vos-ei de todas as nações, e de
todos os lugares para onde vos lancei, diz o Senhor, e tornarei a trazer-vos ao
lugar donde vos mandei para o exílio.
Todo aquele
que viver na Babilônia é considerado como se vivesse na Terra de Israel.
O Rabi
Berokia e o Rabi Eliezer conversavam certa vez, passeando em frente de uma
grade fora de Tiberíade, quando viram um caixão ser trazido para Israel de fora
da Terra. O Rabi Berokia disse: — Para que serve isso? Esse homem viveu e
morreu fora de Israel, e agora regressou para ser aqui enterrado! Vou-lhe citar
as Escrituras: na tua vida "da Minha herança fizestes abominação" (Jer.
II, 7) e na tua morte "a Minha Terra contaminastes" (ibid). O Rabi Eliezer disse-lhe, então:
— Como vai ser enterrado na Terra de Israel, o Senhor, louvado seja Ele,
perdoar-lhe-á, conforme está escrito: "Assim consolará o Seu povo e a Sua
terra" (Deut. XXXII, 43).
Esta lei
(salientando a importância de viver na Terra de Israel) já não está em vigor
devido aos riscos inerentes a uma viagem para a Terra de Israel. Rabbenu Hayyim
mantém que viver na Terra de Israel já não é uma obrigação religiosa devido à
dificuldade e à impossibilidade de cumprir muitos dos preceitos respeitantes ao
solo.
Mordecai
Kaplan apresenta aqui uma opinião contemporânea muito divulgada. Argumenta que
os judeus que vivem em terras de liberdade já não estão no Exílio, embora
mantenha que o Estado de Israel tem uma grande importância para a atual
revivência da cultura e dos valores espirituais judaicos.
Para ele,
Israel é uma necessidade social, política e cultural para a sobrevivência
criadora da sua muito terra-a-terra versão do judaísmo. O mistério da eleição
divina de um povo e de uma terra para ele são elementos ausentes no seu
pensamento. Paz, liberdade e sobrevivência judaica são o seu Messias, não o
Messias da versão tradicional, que aparecerá no mundo como a culminação
dramática da história humana.
Os judeus em
Dispersão continuarão a dever obediência política exclusiva às nações onde
residem. Os elos que juntam os judeus dispersos a Eretz Israel são culturais e
religiosos. A cultura e a vida socioeconômica estão tão estreitamente
relacionadas que é difícil para os judeus dispersos criarem novos valores
culturais judaicos, visto que não há possibilidade de o fazer na Dispersão de
uma vida autônoma judaica, tanto social como econômica.
O judaísmo
americano é necessário e continuará sendo necessário ainda por muito tempo como
uma força para inspirar e motivar a nossa participação no estabelecimento de
uma comunidade judaica...
...Temos uma
parte na vida social, econômica e cultural da América, e, a não ser que demos
ao bem-estar comum do povo americano o melhor que nos ó possível dar, não
estaremos cumprindo todo o nosso dever para com o nosso país. Mas, como judeus,
o melhor que temos para dar, encontra-se no judaísmo, a destilação de séculos
de experiência espiritual judaica. Como judeus convictos e americanos leais, deveríamos
procurar incorporar na vida americana os valores universais do judaísmo,
empregando a santidade tão especial da religião judaica como uma inspiração
para preservar esses valores universais. Não o fazer significaria roubar ao
judaísmo o significado universal e converter a religião judaica num mero
tribalismo sem relevância para a vida além dos interesses isolados do grupo
judaico. A atitude dos judeus isolacionistas ou dos que negam a Dispersão, que
faria com que os judeus americanos estivessem perpetuamente prontos para uma
partida precipitada para Eretz Israel, não poderá nunca inspirar aos nossos
próximos grande confiança no judeu, ou respeito ao judaísmo.
Aqueles
entre os nossos jovens que possuem as habilidades e talentos que são agora
necessários em Eretz Israel, para lá construir uma economia produtiva que
desenvolva a Comunidade Judaica, uma economia baseada na exploração socializada
dos recursos naturais em vez da exploração dos fracos pelos fortes, devem, por
certo, ser encorajados a partirem para Eretz Israel. O esforço colonizador e
construtivo em Eretz Israel deveria alistar os nossos jovens que possuam a
espécie de espírito pioneiro essencial ao desenvolvimento de uma nação. Os
nossos jovens, tanto rapazes como moças, deveriam pensar que ir para Eretz
Israel servir o seu próprio povo é tão legítimo e nobre como é, para os outros
americanos, servir vários povos no Extremo Oriente numa capacidade missionária
ou cultural. Mas os estudantes que planejam ir para Eretz Israel, com a esperança
de se ocuparem numa profissão tradicional ou burocrática, não prestariam
qualquer verdadeiro serviço e apenas privariam a vida judaica americana dos
serviços que lhe pudessem prestar. Nós, os judeus americanos, precisamos
desesperadamente de todas as pessoas disponíveis que tenham a habilidade de
transmudar os valores culturais e religiosos da nossa tradição numa força
criadora viva.
...Aqueles
que desesperam da sobrevivência judaica na Dispersão, pela afirmação de que só
em Eretz Israel poderá o judaísmo sobreviver, esquivam-se à tarefa urgente de
tornar o judaísmo viável na América. A construção de Eretz Israel a longa
distância não é menos importante do que a construção no local, mas não pode
servir como substituto para viver aqui uma vida judaica. Até que os judeus
compreendam que o problema judaico na Dispersão e o problema judaico em Eretz
Israel são problemas iguais, um só problema, afinal, estarão fugindo à
realidade e derrotando os seus próprios objetivos. Só quando assumirmos a
responsabilidade de ter uma vida judaica onde quer que os judeus estejam
vivendo é que poderemos triunfar em qualquer um dos nossos empreendimentos
judaicos.
Não pode
haver dúvida de que na Dispersão nós, os judeus, sofremos da falta do espírito
de dedicação que está presente na renascença do nosso povo em Eretz Israel.
Estamos sem o poder mágico que vem com a palavra, falada e criadora, judaica.
Estamos longe da terra onde o espírito judaico está revivendo. Mas, com
vontade, devoção e inteligência, é possível reviver e reincorporar, dentro da
estrutura da civilização americana, a experiência vital e emotiva do nosso povo
de Eretz Israel para que, a longo prazo, possamos conseguir à nossa maneira uma
tão grande e duradoura contribuição para os valores humanos como eles estão
conseguindo.
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Fonte:
Judaísmo, por: Arthur Hertzberg. Tradução: Fernando de Castro Ferro. Zahar Editores. Rio de Janeiro, 1964, págs. 129-132.
Fonte:
Judaísmo, por: Arthur Hertzberg. Tradução: Fernando de Castro Ferro. Zahar Editores. Rio de Janeiro, 1964, págs. 129-132.
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