Perspectivas do Apocalipse de João
Apesar de
adotar os procedimentos e as estruturas do gênero literário apocalíptico, o
Apocalipse joânico não pode ser reduzido simplesmente a esse gênero. Uma seção
da obra, as cartas às Igrejas da Ásia (Ap. 2-3) aparenta-se mais à maneira do
profetismo tradicional que à forma apocalíptica. Sobretudo por sua
interpretação religiosa da história e por seus verdadeiros centros de
interesse, o Apocalipse de João se distingue da maioria das obras do gênero
literário apocalíptico.
A era nova,
anunciada e esperada pela apocalíptica judaica, foi inaugurada na Ressurreição
do Cristo. Os últimos tempos estão iniciados e os benefícios messiânicos estão
comunicados. Mas esse acontecimento é ainda da ordem do mistério: é sempre
objeto de revelação e só pode ser percebido pela fé. Não obstante, ele tende
para sua realização plena e sua manifestação gloriosa. Por enquanto, mantém-se
a coexistência do "tempo presente" e da "era nova".
Nessa
perspectiva, a clássica ruptura entre essas duas fases da história não tem mais
a mesma significação. Mais que evocar a sucessão de dois períodos antagônicos, ela
ressalta a confrontação de duas ordens de realidades. Por isso, as visões não
têm mais como papel primeiro simbolizar as etapas preparatórias do evento
final. Elas dizem respeito aos diversos aspectos da condição atual da Igreja,
realidade desde já celeste, e, não obstante, ainda confrontada com as potências
deste mundo. Desse modo, a meditação teológica toma o lugar da descrição
apocalíptica do desenvolvimento da história.
O Apocalipse
de João se aproxima das perspectivas da pregação profética, que tendia a
suscitar o despertar espiritual pela comemoração dos eventos fundadores da
Aliança e a consideração da vocação de Israel. Esta atenção ao mistério do
"Reino que vem", mais que à data de sua manifestação gloriosa,
explica por que o Apocalipse de João não explora os procedimentos de pseudonímia
e antedatação que, na apocalíptica tradicional, destinavam-se principalmente a
permitir que se calculasse a proximidade do "Dia do Senhor". O tema
da urgência é, porém, mantido, unido à convicção de que os últimos tempos estão
próximos, certo sentido, já começaram.
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Fonte:
A Bíblia: Tradução Ecumênica - TEB. Edições Paulinas e Edições Loylola. São Paulo, 1995.
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