A condenação sob o ponto de vista da Igreja
É certo que
o caso Galileu versava sobre assuntos de ordem cientifica, aparentemente
associados a autoridade da Santa Igreja, no entanto, a oposição dos teólogos e
do Sumo Pontífice a teses do cientista, não comprometia a inefabilidade do
magistério da Igreja, que tem por âmbito apenas temas de fé e de Moral.
Partindo desse pressuposto, a drástica reação dos teólogos contra Galileu, que
objetivamente tinha razão, se torna ainda mais incompreensível.
No entanto,
segundo as autoridades eclesiásticas, na Idade Média e no início da Idade
Moderna, a Bíblia era o manual utilizado em todos os estudos ('psalmos
discere', aprender os salmos, significava "aprender a ler"; a
alfabetização já era feita com a Bíblia na mão) e era nela que os interessados
buscavam suas noções de astronomia.
De repente,
no início do século XVII, apareceu Galileu defendendo uma tese em aparente
contradição com a escritura sagrada, se apoiando em argumentos fracos, sujeitos
a discussão científica e que não cedia as intimações das autoridades, que lhe
pediam que apresentasse suas ideias como simples hipóteses. Além disto, ele
também intervinha no terreno das exegeses formulando princípios para a
interpretação da Bíblia. Com tal procedimento, ele só podia suscitar suspeitas
e réplicas por parte dos homens da Igreja.
Depoimentos
de escritores do século XVII demonstram que, se Galileu tivesse ficado no plano
da hipótese e não tivesse explicitamente se envolvido em questões de exegese
bíblica, certamente, ele não teria provocado a intervenção do Santo Ofício.
As
descobertas da ciência, aos poucos, fizeram os teólogos ver que a Bíblia não
quer ensinar conhecimentos profanos. Então, eles passaram a distinguir e
aceitar o que no século XVII parecia monstruoso - dois planos que não se
contradizem mutuamente, mas também não interferem um no outro - o plano das
ciências naturais e o da Bíblia.
Partindo
dessa afirmação se torna evidente que para um cristão imbuído da mentalidade
dos séculos XVI e XVII era muito difícil admitir o heliocentrismo. Essa atitude
pode ser observada tanto na postura dos autores protestantes diante do novo
sistema quanto na dos católicos, para os quais, foi custoso compreender que a
Bíblia não ensina cosmologia, de modo que durante dois séculos, resistiram ao
heliocentrismo.
Lutero
julgava que as ideias de Copérnico eram a de um louco, que tornava confusa a
astronomia. Melancton, companheiro de Lutero, declarava que tal sistema era
fantasmagoria e significava a rebordosa das ciências. Kepler astrônomo
protestante contemporâneo de Galileu, teve que deixar a sua terra, Wurttemberg,
por causa de suas ideias copernicanas.
Em 1659, o
Superintendente Geral de Wittenberg, Calovius, além de proclamar que a razão
deve se calar diante da fala da Escritura, verificava com prazer que os
teólogos protestantes, até o último, rejeitavam a teoria que dizia que a Terra
se move.
Em 1662, a
Faculdade de Teologia protestante da Univocidade de Estrasburgo confirmou que o
sistema de Copérnico era uma contradição da Sagrada Escritura. Em 1679, a
Faculdade de Teologia protestante de Upsala (Suécia) condenou Nus Celsius, por
ter defendido o sistema copernicano.
Ainda no
século XVIII, a oposição luterana contra o sistema de Copérnico continuava
muito forte. Em 1744, o pastor Kohlreiff, de Ratzeburg, pregava energicamente
que a teoria do heliocentrismo era uma abominável invenção do diabo.
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Fonte:
Galileu Galilei, por: Morgana Gomes. Editora Minuano. São Paulo, 2001, págs. 41-42.
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