Darwin e Wallace
Nas linhas
anteriores, fez-se menção da carta de 1º de maio de 1856, em que Darwin aprova
inteiramente o ensaio de Wallace. Além disso, na mesma carta, Darwin comunica a
seu correspondente que chegou a uma ideia distinta da de seus predecessores,
referente às causas e aos meios de variação na natureza: "Será ela
verdadeira, será falsa? Que outros a julguem, pois a mais firme convicção que
tem o autor da verdade de sua doutrina não parece ser, infelizmente, a menor
garantia da verdade."
Contente com
essa prova de confiança dada por Darwin, Wallace escreve, a 4 de janeiro de
1858, a seu amigo Bates: "Fiquei muito feliz com uma carta de Darwin, em
que ele me diz que subscreve 'quase palavra por palavra' o meu trabalho. Ele
está preparando agora sua grande obra sobre as espécies e as variedades, para a
qual reúne material há vinte anos. Ele pode me poupar muita dificuldade
provando que não há diferença de natureza entre espécies e variedades, como
também pode me perturbar formulando outra conclusão; mas, de qualquer forma,
poderei trabalhar sobre seus dados." Resulta dessas palavras que Darwin
não partilhou sua concepção referente ao mecanismo de transformação das
espécies com seu correspondente.
Em uma outra
carta, de 22 de dezembro de 1857, que, evidentemente, só chegou a Wallace após
este ter escrito sua própria carta citada acima, Darwin exprime sua
concordância com Wallace, sem lhe comunicar sua própria descoberta: "Mesmo
concordando com suas conclusões, creio que vou bem mais longe; mas
participar-lhe minhas ideias teóricas seria tarefa excessivamente
longa..." Enfim, respondendo a Wallace, parece hesitar em abordar o
problema delicado da evolução do homem: "O sr. me pergunta se eu
discutirei 'o homem'. Acho que evitarei esse tema, que está cercado de tão
grande número de preconceitos, ainda que eu admita que, para um naturalista,
esse seja o problema mais elevado e mais interessante..." Não é sem interesse
observar que Wallace nunca estenderá, por motivos religiosos, sua teoria
transformista até a espécie humana, o que Darwin fará, em seu livro consagrado
à Descendência do homem (1871).
Recebendo,
em 1858, o trabalho de Wallace, Darwin constata que este chegou,
independentemente, às mesmas conclusões relativas à seleção natural, como
principal mecanismo de transformação das espécies. Assim, Darwin escreve uma
carta a Lyell, a 18 de junho de 1858, transmitindo-lhe esse trabalho, que lhe
causa um grave problema de consciência: "Sua previsão se realizou como uma
vingança... Nunca vi coincidência mais impressionante; se Wallace tivesse visto
o manuscrito de meu esboço, escrito em 1842, não teria feito um melhor resumo
dele; seus próprios termos são os títulos de meus capítulos. Peco-lhe que me
devolva o manuscrito; ele não me diz que deseja publicá-lo, mas, naturalmente,
eu me oferecerei para enviá-lo a qualquer jornal. Assim sendo, toda a minha
originalidade, seja ela qual for, será destruída, ainda que meu livro, se é que
ele tem algum valor, não deva sofrer com isso, pois todo o trabalho consiste na
aplicação da teoria. Espero que o sr. aprove o esboço de Wallace, e eu poderei
dizer a ele o que o sr. pensa."
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Fonte:
Darwin e o Darwinismo, por: Denis Buican. Tradução: Lucy Magalhães. Jorge Zahar Editor. Rio de Janeiro, 1987, págs. 37-39.
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