Darwin e o homem
A ideia de
que o darwinismo era uma doutrina que se aplicava apenas aos seres vivos
não-humanos é outra versão absolutamente incorreta. No Origem das Espécies,
Darwin passa comodamente ao largo das implicações de sua teoria com o homem. No
entanto, no seu Origem do Homem, ele
penetra na questão e, aí, suas opiniões deixam pouca margem de dúvida.
Darwin e seu
primo Francis Galton, juntamente com uma série de pensadores seus
contemporâneos, acreditavam que a "raça" humana poderia ser melhorada
se fossem evitados "cruzamentos indesejáveis". A sociedade era vista
com uma clara divisão: de um lado, os membros "superiores", sadios,
inteligentes, ricos e, obviamente, brancos; de outro, os membros
"inferiores", mal nutridos, doentes, pobres, de constituição racial
duvidosa. Estes deveriam ser impedidos de se reproduzirem, pois acabariam por
"rebaixar toda a raça". A evolução biológica do homem poderia ser
"acelerada", imitando-se os mesmos rituais de seleção "vistos"
na Natureza. Os mais aptos, evidentemente, estavam entre os indivíduos das
classes dominantes.
Darwin
chegava até a prever a completa extinção de raças inteiras, consideradas
"inferiores". Escreveu pouco antes da morte, numa carta de 1881:
"Eu poderia esforçar-me e mostrar o que a seleção natural fez e ainda faz
para os progressos da civilização, mais do que aquilo que pareceis admitir.
Lembrai-vos do perigo que correram as nações europeias, alguns séculos atrás,
de serem esmagadas pelos turcos e do quanto esta ideia nos parece ridícula hoje
em dia. As raças mais civilizadas, que chamamos de caucásicas, bateram os
turcos em campo raso na luta pela existência. Fazendo um relance sobre o mundo,
sem olhar num porvir muito longínquo, quantas raças inferiores serão em breve
eliminadas pelas raças que têm um grau de civilização superior!".
Se
lembrarmos do jovem naturalista na Austrália, veremos que era exatamente este o
raciocínio que utilizou para prever o futuro do canguru: seria dizimado pelos
magricelas galgos ingleses. Se esta previsão estava errada, desgraçadamente
Darwin acertou com relação aos "civilizados": assassinaram
impiedosamente os povos primitivos que não aceitaram a submissão ao seu
domínio.
No Origem do Homem, deixava muito claras
suas posições racistas: "A seleção permite ao homem agir de modo
favorável, não somente na constituição física de seus filhos, mas em suas
qualidades intelectuais e morais (sic).
Os dois sexos deveriam ser impedidos de desposarem-se quando se encontrassem em
estado de inferioridade muito acentuada de corpo ou espírito." E mais
adiante: "Todos aqueles que não podem evitar uma abjeta pobreza para seus
filhos deveriam evitar de se casar, porque a pobreza não é apenas um grande
mal, mas ela tende a aumentar; (...) enquanto os inconscientes se casam e os
prudentes evitam o casamento,os membros inferiores da sociedade tendem a
suplantar (em número) os membros superiores. Como todos os animais, o homem
chegou certamente ao seu alto grau de desenvolvimento atual mediante luta pela
existência, que é consequência de sua multiplicação rápida; e, para chegar a um
mais alto grau ainda, é preciso que continue a ser mantida uma luta rigorosa
(...). Deveria haver concorrência aberta para todos os homens e dever-se-iam
fazer desaparecer todas as leis e todos os costumes que impedem os mais capazes
de conseguir seus objetivos e criar o maior número possível de crianças."
O grande
Charles Darwin não declara expressamente a que grupo pertencia. Mas pelo fato
de ter tido dez filhos e de ser uma pessoa rica, deduz-se facilmente...
É comum
dizer-se que Darwin não afirmou que o homem descendia do macaco. Isto está
correto. Darwin dizia coisa muito pior. Seu racismo não o abandonava. Afirmava
que o homem descendia dos selvagens!
E não parava aí. Dizia que preferia descender de um forte e valente macaco, do
que ter um desses selvagens como ancestral.
A aplicação
de sua teoria ao homem, ou, mais propriamente, a extensão ao organismo humano
dos valores burgueses de propriedade
privada e acumulação, resultou no que se chamou eugenia. Ò melhoramento da raça através das recomendações da
eugenia eram os ideais do nazismo. O Estado Nazista não era, portanto, nada
mais que um Estado capitalista onde a melhoria do corpo dos cidadãos fazia
parte da estratégia global de aumento de produtividade.
Hitler
garantia procriação aos cidadãos alemães que possuíssem cabelos loiros, boa
estrutura, rosto estreito, queixo bem formado, nariz fino e arrebitado, olhos
claros e profundos e pele de um branco rosado. Os homens selecionados poderiam
ingressar na tropa de elite, a SS, e poderiam ter o número de filhos que
desejassem, sem precisar casar. O Estado cuidaria de criar e educar tais
crianças, segundo os ideais do nazismo.
A trajetória
do nazismo é bem conhecida. As câmaras de gás e os seis milhões de
assassinatos, também. O que pouco se fala é que os Estados Unidos também
adotavam políticas eugenistas na mesma época.
No Congresso
de Eugenia de Nova Iorque, em 1933, foi proposta a esterilização em massa dos
alcoólatras, criminosos e loucos. Tal medida "limparia" a sociedade
norte-americana de toda "escória humana", em poucas gerações. No
Brasil, a Liga Brasileira de Higiene Mental propôs, em 1934, que se formassem
tribunais eugênicos, para classificar os indivíduos, reforma eugênica dos
salários (os brancos deveriam ganhar mais) e seguro-paternidade eugênico,
assegurando assistência à criança branca.
A eugenia de
forma alguma foi característica exclusiva do nazismo. Esteve, e está, presente
nas nações capitalistas com pretensões hegemônicas. Os "bancos de
esperma", as pesquisas de fecundação artificial, etc., são prova disto.
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Fonte:
Coleção Primeiros Passos: O que é Darwinismo, por: Nélio Marco. Editora Brasiliense, 2ª Edição. São Paulo, 1989, págs. 67-71.
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