terça-feira, 5 de julho de 2016

Biografia de Camões

Luís Vaz de Camões
1. VIDA
Lisboa (?), 1525 (?) —1580
A biografia e a bibliografia de Luís Vaz de Camões levantam numerosos problemas insolúveis por falta de dados. Alguns fatos apurados como certos, ou mais prováveis, através de documentos oficiais (registros das armadas, cartas de perdão, cartas de tença ou pagamento), de memórias conservadas pelos primeiros biógrafos, que conheceram o poeta ou contemporâneos dele, e de alusões autobiográficas precisas na sua própria obra, permitem formar uma ideia geral do que foi a vida de Camões.
Nascido em 1524 ou 1525, provavelmente em Lisboa, de uma família da pequena nobreza, embora decaída e pobre, reconhece-se na sua obra uma educação escolar que se pode considerar esmerada, porventura o curso de Artes em Coimbra, então instalado em Santa Cruz, de que o tio foi cancelário. Quando novo, rodou na órbita de centros aristocráticos (talvez mesmo a Corte), e frequentou ao mesmo tempo a boêmia desregrada de Lisboa. As suas cartas particulares mostram-no envolvido em brigas noturnas entre bandos, com outros fidalgos arruaceiros e com mulheres fáceis do Bairro Alto. Razões ignoradas mantiveram-no à margem dos círculos letrados, especialmente daquele que constelava em torno de Sá de Miranda. Talvez uma vida desassossegada e aventurosa o desclassificasse perante os graves desembargadores letrados, cujo tipo mais representativo foi o seu contemporâneo Dr. António Ferreira. Provavelmente a sua condição de fidalgo pobre e desprotegido é que o obrigou (em contraste com João de Barros, Ferreira, Caminha e outros) a preferir a carreira das armas à das letras; combateu em Marrocos, onde perdeu um olho em combate, desastre que assinalou na sua obra. Em 1550, à semelhança de tantos fidalgos sem recursos, alistou-se para a índia, mas não chegou a embarcar; em 1552, uma rixa em que deixou ferido um funcionário do Paço atirou-o para a cadeia, donde, meses depois, em março de 1553, saiu perdoado e multado a embarcar para a índia.
A estada no Oriente foi acidentada. Assinalamo-lo não só em Goa, mas ainda no Golfo Pérsico, em Ternate, no desempenho de um cargo de provedor de defuntos e ausentes em Macau, na costa de Cochinchina, onde naufragou, perdendo os haveres e uma companheira chinesa, e salvando-se a nado com o manuscrito d'Os Lusíadas, episódio que não se esqueceu de consignar no próprio poema. Em Goa enredou-se em complicações que o levaram de novo à cadeia, por dívidas. Não lhe faltaram, todavia, relações e talvez proteções, que aliás procurou: perante o governador Francisco Barreto representou o Auto do Filodemo; sobre o vice-rei D. Constantino de Bragança compôs uma ode, em que o defende contra críticas ou censuras de que era objeto e lhe promete a imortalidade nos seus versos; com o vice-rei Francisco de Sousa Coutinho teve relações amistosas. De um deles obteve a nomeação para a feitoria de Chaul, mas não chegou a ocupar o cargo. Manteve ainda relações de camaradagem ou convivência com Diogo do Couto, o continuador das Décadas, e com o Dr. Garcia de Orta, para cujo Diálogo dos Simples e Drogas escreveu uma ode de recomendação ao vice-rei. Em 1567, quando, após tantos anos de estada no Oriente, as dificuldades econômicas o afligiam mais do que nunca, um amigo nomeado como capitão para Moçambique promete-lhe aí um emprego e adianta-lhe o pagamento das passagens; mas é provável que isso lhe sorrisse principalmente como escala de regresso, pois cerca de dois anos depois é um grupo de outros amigos, em trânsito para a Metrópole, que se cotiza entre si para o resgate das dívidas entretanto contraídas e para a sua viagem até Lisboa. Aqui chegou, portanto, em 1569; trazia na bagagem Os Lusíadas, que logo tratou de editar; entretanto fora-lhe roubada uma coletânea de poemas líricos, o Parnaso Lusitano. Conjectura-se que esta coletânea continha apenas as composições em estilo "italiano". Após a publicação d'Os Lusíadas (1572) alcançou uma tença trienal, aliás modesta, e nem sempre paga (com regularidade. O seu nome começou a correr; composições líricas suas, e até cartas, foram recolhidas em cancioneiros particulares manuscritos; mas só começaram a ser publicadas a seguir à sua morte no Cancioneiro de Luís Franco Correia (1580). Os últimos anos foram de miséria, segundo os testemunhos mais próximos. O seu enterro (1579 ou 1580) teve de ser feito às expensas de uma instituição de beneficência, a Companhia dos Cortesãos.
Em alguns passos da obra atribui Camões a responsabilidade dos seus desastres a amores infelizes; mas não passa de romance biográfico sem fundamento tudo o que desde o século XVII até ao primeiro quartel do século XX se tem imaginado acerca de desterros ou perseguições devidos a amores infelizes por uma alta dama do Paço, seja ela Catarina de Ataíde ou a infanta D. Maria. A única coisa segura é que amores diversos e diversamente sucedidos desempenham um papel importante na vida deste poeta, que poderia aplicar a si próprio o verso de Bernardim:"Fui o seu grande amador."
(Antônio José Saraiva e Oscar Lopes)
2. OBRA
I.   Poesia épica
• Os Lusíadas, 1572, Lisboa.
II. Poesia lírica
• Rimas, edição póstuma: 1595.
Em vida, Camões viu publicados somente três de seus poemas líricos: uma ode, um soneto e uma elegia. A primeira edição das Rimas de Luís de Camões (Rhythmas de Luís de Camões, título original) foi organizada por Fernão Rodrigues Lobo Soropita e publicada em Lisboa, no ano de 1595. Baseadas em cancioneiros manuscritos, as edições de Soropita (1595 e 1598) incorporam as falhas desses códices (atribuições errôneas, versos malcopiados).
As sucessivas edições, de Domingos Fernandes, de Faria e Sousa, de António Álvares da Cunha, do Visconde da Juromenha e de Teófilo Braga, foram avolumando a obra lírica de Camões, à custa de vários poetas, cujos textos foram incorporados às Rimas.
Carolina Michaëlis de Vasconcelos e Guilherme Storck iniciaram um minucioso trabalho de expurgo dos poemas erroneamente atribuídos a Camões. Em 1932, José Maria Rodrigues e Afonso Lopes Vieriaeliminaram 248 composições que andavam atribuídas, sem fundamento, a Camões.
Não está concluído o trabalho definitivo do texto lírico camoniano. As três edições críticas recentes, em que se fundam a maioria dos estudos brasileiros a que o vestibulando terá acesso, são: a de Hernâni Cidade, Luís de Camões, Obra Completa, Lisboa, Sá da Costa, 1946, 5v.; a de Álvaro Júlio da Costa Pimpão, Rimas, Coimbra, Actas Universitatis Conimbrigensis/Atlântida, 1953; e a de António Salgado Júnior, Luís de Camões, Obra Completa, Rio de Janeiro, Aguilar, 1963 (Col. Biblioteca Luso-Brasileira).
A lírica de Camões compreende duas vertentes principais:
• a lírica tradicional, composta em redondilhas (medida velha), nos moldes da poesia palaciana do Cancioneiro Geral de Garcia de Resende, nos gêneros característicos da poesia peninsular do século XV e início do XVI: os motes glosados, cantigas, vilancetes, esparsas e trovas;
a lírica clássica, composta em decassílabos (medida nova), vazada nas formas fixas de influência italiana: sonetos, éclogas, odes, sextinas, oitavas, elegias e canções.
As edições mais recentes, a partir da Lírica de Camões, de José Maria Rodrigues e Afonso Lopes Vieira (1932), incluem cerca de 377 composições, somadas as composições na medida velha e na medida nova. As edições mais acessíveis ao candidato contabilizam 70 sonetos (Cultrix e Ediouro, ambas organizadas pelo prof. Massaud Moisés). As edições críticas contabilizam cerca de 204 sonetos, incluídos os de autoria duvidosa.

III. Teatro
Anfitriões, comédia de inspiração clássica, em cinco atos, composta em quintilhas e redondilhas maiores.
El-Rei Seleuco, comédia em um ato, composto em redondilhas maiores.
Filodemo, comédia novelesca, análoga à produção gilvicentina, ainda que estruturada em cinco atos, como as comédias clássicas. Composta em quintilhas e redondilhas maiores. Tema de inspiração medieval.

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Fonte:
Os Livros da Fuvest - II (1999), por: Francisco Achcar e Fernando Teixeira de Andrade. Objetivo, 1999, págs. 5-8.

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