Luís Vaz de Camões
1. VIDA
Lisboa (?), 1525 (?) —1580
A biografia
e a bibliografia de Luís Vaz de Camões levantam numerosos problemas insolúveis
por falta de dados. Alguns fatos apurados como certos, ou mais prováveis,
através de documentos oficiais (registros das armadas, cartas de perdão, cartas
de tença ou pagamento), de memórias conservadas pelos primeiros biógrafos, que
conheceram o poeta ou contemporâneos dele, e de alusões autobiográficas
precisas na sua própria obra, permitem formar uma ideia geral do que foi a vida
de Camões.
Nascido em
1524 ou 1525, provavelmente em Lisboa, de uma família da pequena nobreza,
embora decaída e pobre, reconhece-se na sua obra uma educação escolar que se
pode considerar esmerada, porventura o curso de Artes em Coimbra, então
instalado em Santa Cruz, de que o tio foi cancelário. Quando novo, rodou na
órbita de centros aristocráticos (talvez mesmo a Corte), e frequentou ao mesmo
tempo a boêmia desregrada de Lisboa. As suas cartas particulares mostram-no
envolvido em brigas noturnas entre bandos, com outros fidalgos arruaceiros e
com mulheres fáceis do Bairro Alto. Razões ignoradas mantiveram-no à margem dos
círculos letrados, especialmente daquele que constelava em torno de Sá de
Miranda. Talvez uma vida desassossegada e aventurosa o desclassificasse perante
os graves desembargadores letrados, cujo tipo mais representativo foi o seu
contemporâneo Dr. António Ferreira. Provavelmente a sua condição de fidalgo
pobre e desprotegido é que o obrigou (em contraste com João de Barros,
Ferreira, Caminha e outros) a preferir a carreira das armas à das letras;
combateu em Marrocos, onde perdeu um olho em combate, desastre que assinalou na
sua obra. Em 1550, à semelhança de tantos fidalgos sem recursos, alistou-se
para a índia, mas não chegou a embarcar; em 1552, uma rixa em que deixou ferido
um funcionário do Paço atirou-o para a cadeia, donde, meses depois, em março de
1553, saiu perdoado e multado a embarcar para a índia.
A estada no
Oriente foi acidentada. Assinalamo-lo não só em Goa, mas ainda no Golfo
Pérsico, em Ternate, no desempenho de um cargo de provedor de defuntos e
ausentes em Macau, na costa de Cochinchina, onde naufragou, perdendo os haveres
e uma companheira chinesa, e salvando-se a nado com o manuscrito d'Os Lusíadas, episódio que não se
esqueceu de consignar no próprio poema. Em Goa enredou-se em complicações que o
levaram de novo à cadeia, por dívidas. Não lhe faltaram, todavia, relações e
talvez proteções, que aliás procurou: perante o governador Francisco Barreto
representou o Auto do Filodemo; sobre o vice-rei D. Constantino de Bragança
compôs uma ode, em que o defende contra críticas ou censuras de que era objeto
e lhe promete a imortalidade nos seus versos; com o vice-rei Francisco de Sousa
Coutinho teve relações amistosas. De um deles obteve a nomeação para a feitoria
de Chaul, mas não chegou a ocupar o cargo. Manteve ainda relações de
camaradagem ou convivência com Diogo do Couto, o continuador das Décadas, e com o Dr. Garcia de Orta,
para cujo Diálogo dos Simples e Drogas escreveu uma ode de
recomendação ao vice-rei. Em 1567, quando, após tantos anos de estada no
Oriente, as dificuldades econômicas o afligiam mais do que nunca, um amigo
nomeado como capitão para Moçambique promete-lhe aí um emprego e adianta-lhe o
pagamento das passagens; mas é provável que isso lhe sorrisse principalmente
como escala de regresso, pois cerca de dois anos depois é um grupo de outros
amigos, em trânsito para a Metrópole, que se cotiza entre si para o resgate das
dívidas entretanto contraídas e para a sua viagem até Lisboa. Aqui chegou,
portanto, em 1569; trazia na bagagem Os
Lusíadas, que logo tratou de editar; entretanto fora-lhe roubada uma
coletânea de poemas líricos, o Parnaso
Lusitano. Conjectura-se que esta coletânea continha apenas as composições
em estilo "italiano". Após a publicação d'Os Lusíadas (1572) alcançou uma tença trienal, aliás modesta, e nem
sempre paga (com regularidade. O seu nome começou a correr; composições líricas
suas, e até cartas, foram recolhidas em cancioneiros particulares manuscritos;
mas só começaram a ser publicadas a seguir à sua morte no Cancioneiro de Luís Franco Correia (1580). Os últimos anos foram de
miséria, segundo os testemunhos mais próximos. O seu enterro (1579 ou 1580)
teve de ser feito às expensas de uma instituição de beneficência, a Companhia
dos Cortesãos.
Em alguns
passos da obra atribui Camões a responsabilidade dos seus desastres a amores
infelizes; mas não passa de romance biográfico sem fundamento tudo o que desde
o século XVII até ao primeiro quartel do século XX se tem imaginado acerca de
desterros ou perseguições devidos a amores infelizes por uma alta dama do Paço,
seja ela Catarina de Ataíde ou a infanta D. Maria. A única coisa segura é que
amores diversos e diversamente sucedidos desempenham um papel importante na vida
deste poeta, que poderia aplicar a si próprio o verso de Bernardim:"Fui o
seu grande amador."
(Antônio
José Saraiva e Oscar Lopes)
2. OBRA
I.
Poesia épica
• Os Lusíadas, 1572, Lisboa.
• Os Lusíadas, 1572, Lisboa.
II. Poesia
lírica
• Rimas, edição póstuma: 1595.
• Rimas, edição póstuma: 1595.
Em vida,
Camões viu publicados somente três de seus poemas líricos: uma ode, um soneto e
uma elegia. A primeira edição das Rimas
de Luís de Camões (Rhythmas de Luís
de Camões, título original) foi organizada por Fernão Rodrigues Lobo
Soropita e publicada em Lisboa, no ano de 1595. Baseadas em cancioneiros
manuscritos, as edições de Soropita (1595 e 1598) incorporam as falhas desses
códices (atribuições errôneas, versos malcopiados).
As
sucessivas edições, de Domingos Fernandes, de Faria e Sousa, de António Álvares
da Cunha, do Visconde da Juromenha e de Teófilo Braga, foram avolumando a obra
lírica de Camões, à custa de vários poetas, cujos textos foram incorporados às Rimas.
Carolina
Michaëlis de Vasconcelos e Guilherme Storck iniciaram um minucioso trabalho de
expurgo dos poemas erroneamente atribuídos a Camões. Em 1932, José Maria
Rodrigues e Afonso Lopes Vieriaeliminaram 248 composições que andavam
atribuídas, sem fundamento, a Camões.
Não está
concluído o trabalho definitivo do texto lírico camoniano. As três edições
críticas recentes, em que se fundam a maioria dos estudos brasileiros a que o
vestibulando terá acesso, são: a de Hernâni Cidade, Luís de Camões, Obra Completa, Lisboa, Sá da Costa, 1946, 5v.; a de
Álvaro Júlio da Costa Pimpão, Rimas, Coimbra, Actas Universitatis
Conimbrigensis/Atlântida, 1953; e a de António Salgado Júnior, Luís de Camões, Obra Completa, Rio de
Janeiro, Aguilar, 1963 (Col. Biblioteca Luso-Brasileira).
A lírica de
Camões compreende duas vertentes principais:
• a lírica tradicional, composta em redondilhas (medida velha), nos moldes
da poesia palaciana do Cancioneiro Geral
de Garcia de Resende, nos gêneros característicos da poesia peninsular do
século XV e início do XVI: os motes
glosados, cantigas, vilancetes, esparsas e trovas;
• a lírica clássica, composta em decassílabos (medida nova), vazada nas
formas fixas de influência italiana: sonetos,
éclogas, odes, sextinas, oitavas, elegias e canções.
As edições
mais recentes, a partir da Lírica de
Camões, de José Maria Rodrigues e Afonso Lopes Vieira (1932), incluem cerca
de 377 composições, somadas as composições na medida velha e na medida nova. As
edições mais acessíveis ao candidato contabilizam 70 sonetos (Cultrix e
Ediouro, ambas organizadas pelo prof. Massaud Moisés). As edições críticas
contabilizam cerca de 204 sonetos, incluídos os de autoria duvidosa.
III. Teatro
• Anfitriões, comédia de inspiração
clássica, em cinco atos, composta em quintilhas e redondilhas maiores.
• El-Rei Seleuco, comédia em um ato,
composto em redondilhas maiores.
• Filodemo, comédia novelesca, análoga à
produção gilvicentina, ainda que estruturada em cinco atos, como as comédias
clássicas. Composta em quintilhas e redondilhas maiores. Tema de inspiração
medieval.
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Fonte:
Os Livros da Fuvest - II (1999), por: Francisco Achcar e Fernando Teixeira de Andrade. Objetivo, 1999, págs. 5-8.
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