Simões Lopes Neto
Natural de
Pelotas, Rio Grande do Sul, J. Simões Lopes Neto foi, sem dúvida alguma; o escritor regionalista que melhor soube imprimir "cor
local" às suas
obras. Tanto espelhando
os tragos mais característicos do
gaúcho, como revelando
seu folclore ou dando
forma definitiva a algumas
das mais belas
lendas, conseguiu sempre
e em todos
os casos manter-se
num elevado nível artístico, que o faz, ainda hoje,
atual e vivo como poucos dos nossos
prosadores do passado.
Vivendo entre 1885
e 1916, somente nos deixou três livros: "Lendas do Sul", "Cancioneiro Guasca" e "Contos Gauchescos". Três
livros definitivos e eternos,
acrescente-se. Toda a alma
guasca está nos seus contos, "que
valem por uma epopeia cíclica,
antes contada que
escrita, como um
tom narrativo da mais tocante familiaridade", acentua o sr.
Agripino Grieco, acrescentando que os
seus "tipos, velhos
e moços, negros e brancos,
movem-se diante de nós
com a
desenvoltura da vida, com a
caracterização inconfundível do real."
Se nos contos consegue
manter a atmosfera
dramática ou cômica
com um raro poder de ficcionista, nas
lendas revive, com notável dom
poético, toda a beleza de histórias como a "Salamanca do Jarau" ou "Negrinho
do Pastoreio", legítimas obras-primas destinadas a despertar emoções pelo
decorrer dos séculos.
O segredo
da perenidade de
J. Simões Lopes
Neto estará, certamente, na
fidelidade com que soube ascultar a alma do audacioso gaúcho,
na certeza psicológica
cora que soube
fixar-lhe os traços mais
característicos. Apesar do
vocabulário, ou melhor, dos
modismos típicos da região do sul,
pode ser lido pelo
brasileiro de qualquer
região. Pelo brasileiro
do centro, do
norte ou do nordeste. E não somente lido, como compreendido. Acontece que J.
Simões Lopes inspirando-se diretamente
no povo, jamais o
traiu, sob qualquer
pretexto. Manteve-se fiel
ao sentir e
pensar desse povo,
com o qual
conviveu no mais
íntimo e amoroso consórcio. Blau, o vaqueano, é bem ele, em toda sua
simplicidade e rusticidade, genuíno
tipo crioulo rio-grandense, guasca
sadio, que depois de "trotar sobre tantíssimos rumos: das pousadas
pelas estâncias; aos fogões a que se aqueceu; dos ranchos em que cantou, dos
povoados que atravessou, das cousas que ele compreendia e das que eram-lhe
vedadas ao singelo entendimento; do "pelo a pelo" com os homens, das
erosões da morte e das eclosões da vida", conta, agora, ao patrício
deslumbrado, tudo quanto ficou semeado na longa estrada das suas recordações,
casos que de "vez era quando o vaqueano recontava, como quem estende ao
sol, para arejar, roupas guardadas no fundo de uma arca..." E porque conta
com ternura e simplicidade, ainda hoje o lemos com verdadeiro enlevo, com o
encanto que as obras-primas sempre conseguem despertar.
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Fonte:
As Obras-Primas do Conto Brasileiro. Seleção e notas de: Edgard Cavalheiro e Almiro Rolmes Barbosa. Martins Editora, 4ª Edição. São Paulo, 1952, págs. 319-320.
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