As novelas de cavalaria e a literatura de
cordel
As novelas
de cavalaria constituem um exemplo expressivo da influência dos povos ibéricos
na formação da cultura brasileira. Trazidas pelos colonizadores, essas
narrativas acabaram se incorporando à nossa cultura popular, principalmente a
da região nordestina, onde a literatura de cordel até hoje reflete essa
influência.
Dentre os
vários tipos de cordel, destacam-se os "romances" (em prosa ou
verso), que contam as histórias de cavaleiros e damas famosos e lendários, tais
como Carlos Magno e os doze pares de
França. Observe que, à semelhança da novela Amadis de Gaula, esses
"romances" de cordel também são feitos para serem lidos em voz alta.
Para uma
rápida visão de conjunto das origens do cordel, leia este trecho de Marlyse
Meyer:
"Sempre
foi muito vivo no Nordeste o costume das histórias narradas nos serões
familiares, nas varandas das fazendas de gado, na casa-grande e nas roças dos
engenhos de cana-de-açúcar. Esse costume proveio de uma longa tradição ibérica,
dos romanceros, das histórias de
Carlos Magno e dos doze pares de França e outros grandes livros populares.
Originou-se também de contos maravilhosos de 'varinha de condão', de bichos
falantes, de bois - sobretudo na região nordestina, onde se desenvolveu o
'ciclo do gado', e ainda de histórias do folclore universal e africano - estas
trazidas pelos escravos, acostumados à narrativa oral em suas terras de origem.
As histórias
eram veiculadas por cantadores ambulantes, que iam de fazenda em fazenda, de
feira em feira, transmitindo notícias de um lugar para outro, aproximando as
pessoas. Reproduziam histórias, inventando cantos, improvisos, repentes,
desafios e pelejas entre cantadores.
Contadores
de histórias e cantadores de cantorias sempre estiveram associados ao mundo
nordestino, no seu duplo sistema de organização: pastoril, do interior
sertanejo - ao qual virá acrescentar-se posteriormente o plantio de algodão; e
agrícola, no mundo fechado da cana-de-açúcar do litoral. Pode-se explicar isto
pelas características do Nordeste:
'As
condições sociais de formação do Nordeste como que predispuseram para que
pudesse surgir, desenvolver-se e tomar características próprias este tipo de
manifestação cultural... A organização da sociedade patriarcal, o surgimento de
manifestações messiânicas, o aparecimento de bandos de cangaceiros ou bandidos,
as secas periódicas provocando desequilíbrio econômico e social, as lutas de
família (...) deram oportunidade para que se verificasse o surgimento de grupos
de cantadores como instrumentos do pensamento coletivo, das manifestações da
memória popular'.
Embora nem
sempre seja satisfatório explicar os traços culturais pelas peculiaridades
sociais da região, não há como não se espantar diante da incrível criatividade,
do sentido de festa, da veia poética da gente nordestina. Essa gente inventou
toda uma literatura oral e escrita, todo um sistema poético e musical, onde
versos, ritmos, imagens se irmanam estreitamente com sua peculiar realidade.
A seguir,
temos um trecho de um desses "romances" inspirados em tradições medievais,
escrito por Leandro Gomes de Barros (1865-1918), um dos principais autores de
cordel do Brasil.
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Fonte:
Estudos de Língua e Literatura, por: Douglas Tufano. Editora Moderna, 4ª Edição. São Paulo, 1992, págs. 124-125.
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