A crise do populismo
A crise dos
regimes populistas iniciou-se em meados da década de 1950 e foi gerada antes de
tudo por fatores internos de cada país, em especial pelo esgotamento do modelo econômico
do populismo. Os fatores externos podem ser resumidos no avanço mundial do imperialismo,
principalmente norte-americano, que resultou numa impossibilidade cada vez
maior de desenvolvimento de um capitalismo nacional.
Nos anos
iniciais da crise do modelo populista, em alguns países realizou-se a
experiência do desenvolvimentismo, que consistiu numa associação das burguesias
nacionais com o capital estrangeiro, ao mesmo tempo que eram mantidas algumas
características do populismo, como a democracia política e a força das
organizações das classes trabalhadoras.
O
desenvolvimentismo também entrou em crise, sendo substituído por regimes
militares, que procuraram liquidar totalmente os traços da experiência
populista, e continuaram com o processo de abertura ao capital estrangeiro.
Em alguns
países, procurou-se uma superação do subdesenvolvimento e da dependência, por
meio do socialismo, vitorioso em Cuba, esmagado no Chile e derrotado em
eleições e por pressões norte-americanas na Nicarágua.
Crise do populismo e economia
O suicídio
do presidente Vargas, em 1954, e a queda de Perón, em 1955, marcaram de forma
espetacular o início da crise dos regimes populistas, que se estendeu pelos
anos 60 em outros países, além do Brasil e da Argentina. Um estudo dessa
mudança política exige uma visão da economia e da vida social no continente nas
últimas décadas.
Fatores econômicos e internos da crise
A constante
queda dos preços dos produtos primários, que se acentuou a partir de 1953,
passou a ser um dos elementos básicos do quadro econômico latino-americano.
Naquele ano findou a fase de ascensão dos produtos primários no mercado
internacional iniciada com o fim da Segunda Guerra.
A queda de
preços teve maior impacto no setor agrário que, com exceção de México, Bolívia
e Venezuela, não foi alterado pelos regimes populistas. O quadro, que dura até
os dias de hoje na maior parte da América Latina, era o do latifúndio
improdutivo ou monocultor e dependente do mercado internacional; 90% das terras
cultiváveis continuaram nas mãos de 10% da população. Frequentemente, a
alternativa ao latifúndio era o minifúndio, incapaz de prover a subsistência de
quem o cultivava. Os problemas dessa estrutura agrária eram inúmeros e alguns
de crescente importância no quadro das economias nacionais: baixa remuneração
do trabalho, que contribuía para o reduzido desenvolvimento do mercado interno;
êxodo rural e o decorrente "inchaço" das cidades; baixa
produtividade, que forçava a importação de alimentos em países de grande
potencial agrícola.
Além de
agudizar a crise do setor primário, diminuindo a sua renda, a queda de preços
acarretou um outro grave problema, a saber: a incapacidade de realizar
importações pela falta de divisas. A diminuição da capacidade de importar era
particularmente grave, pois tornava mais difícil o desenvolvimento da indústria
de bens de consumo (para não se falar das de bens de capital), que necessitava
de tecnologia, máquinas e matérias-primas.
Os problemas
criados pela industrialização também eram vários. A indústria criou novas
necessidades, levou a um aumento das importações e acentuou um velho problema
latino-americano: o endividamento externo. Utilizando tecnologia avançada, o
desenvolvimento industrial não absorveu mão-de-obra em ritmo compatível com o
crescimento da população e o êxodo provocado pela crise da agricultura. O
crescimento da população urbana manteve baixos os salários e aumentou a demanda
de serviços públicos nas cidades, fazendo crescer as despesas do Estado, que já
eram altas por causa dos investimentos em obras de infraestrutura e atividades econômicas
não lucrativas, necessárias ao desenvolvimento.
Todo esse
quadro marcado pelo endividamento externo e pelo aumento das despesas
governamentais conduziu às altas taxas de inflação que caracterizaram a agonia
do populismo.
No início da
década de 60, surgiu no Brasil um livro chamado Um dia na vida de Brasilino, que mostrava de forma satírica algo
que ocorria em toda a América Latina, ou seja, a internacionalização ou
americanização da economia e da vida cotidiana. Brasilino, um típico
representante da classe média alta, acordava depois de dormir com Lençóis
Santista, na realidade fabricados por uma companhia inglesa; lavava o rosto e
escovava os dentes com produtos da Gessy-Lever; tomava o café da manhã com pão
fabricado pela Pulmann, margarina da Anderson Clayton e Nescafé da Nestlé;
depois de um cigarro da Souza Cruz, "que não é do seu Souza e nem do seu
Cruz...", saía de casa num Ford abastecido num posto da Esso. E, assim, lá
ia o Brasilino, que podia ser cidadão de qualquer país latino-americano,
pagando dividendos às empresas multinacionais o dia inteiro até o momento de
aguardar o sono com um filmezinho na TV, invariavelmente norte-americano.
A estória de
Brasilino vale um tratado de economia para mostrar a grande expansão dos países
capitalistas centrais na América Latina. A penetração imperialista, que sempre
existiu, acentuou-se a partir da década de 50 e com isso estabeleceu-se uma
nova divisão internacional do trabalho. Anteriormente, a América Latina
desempenhava a função de produtora de produtos primários e consumidora de
manufaturados da indústria dos países centrais. Esse quadro começou a ser
alterado com o desenvolvimento de uma indústria local, o que gerou uma política
protecionista e fez surgir em muitos países a esperança de desenvolvimento de
um capitalismo nacional, alimentada pelo nacionalismo dos regimes populistas.
Mas a
evolução da economia capitalista mundial veio a desmentir essas esperanças.
Visando neutralizar as barreiras alfandegárias e aproveitar a mão-de-obra
barata nos países da América Latina, as grandes corporações de atuação
multinacional, a partir da década de 50, passaram a exportar capitais e
tecnologia, destinados a construir linhas de montagem e fábricas para a
produção de bens de consumo imediatos e duráveis; para isso contaram com a
captação de recursos nas sociedades locais e inúmeras vantagens oferecidas pelos
governos latino-americanos.
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Fonte:
História da América, por: Raymundo Campos. Atual Editora, 2ª Edição. São Paulo, 1995, págs. 224-226.
Fonte:
História da América, por: Raymundo Campos. Atual Editora, 2ª Edição. São Paulo, 1995, págs. 224-226.
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