terça-feira, 5 de julho de 2016

A Escola de Sócrates

A Escola de Sócrates

Eu nunca fui mestre de ninguém, conquanto nunca me opusesse a moço ou velho que me quisesse ouvir no desempenho de minha tarefa. Tampouco falo se me pagam, e se não pagam, não; estou igualmente à disposição do rico e do pobre, para que me interroguem ou, se preferirem ser interrogados, para que ouçam o que digo. Se algum deles vira honesto ou não, não é justo que eu responda pelo que jamais prometi nem ensinei a ninguém. Quem afirmar que de mim aprendeu ou ouviu em particular alguma coisa que não todos os demais, estai certos de que não diz a verdade. Então, por que será que alguns gostam de se entreter comigo tanto tempo? Vós o ouvistes, Atenienses; eu vos disse toda a verdade; eles gostam de me ouvir examinar os que supõem ser sábios e não o são; e isso não deixa de ter o seu gosto. Mas, repito, faço-o por uma determinação divina, vinda não só através do oráculo, mas também de sonhos e de todas as vias pelas quais o homem recebe ordens dos deuses. É fácil de comprovar essa verdade; se há moços que estou corrompendo e outros que já corrompi, forçosamente, decerto, alguns deles já amadurecidos compreenderam que outrora, na sua mocidade, eu lhes dera maus conselhos e podem levantar-se para me acusar e punir; se não o quiserem eles fazer, alguém da família, o pai, os irmãos, outros parentes, se os seus familiares sofreram qualquer má influência minha, podem lembrá-la agora e punir-me. Há um bem grande número deles que estou vendo aqui, começar por Críton, que é da minha idade e do meu bairro, pai de Critobulo aqui presente; em seguida, Lisânias de Esfetos, pai de Esquines, que aí está; depois, Antifonte de Cefísia, pai de Epígenes; aí estão outros, cujos irmãos frequentaram aqueles entretenimentos: Nicóstrato, filho de Teozótides e irmão de Teódoto — Teódoto, por sinal, morreu e não poderia estorvá-lo com sua intercessão; há mais, Para-lo, filho de Demódoco, de quem era irmão, Teages; esse outro é Adimanto, filho de Aristão, de quem é irmão, Platão, aqui presente; esse é Ajantodoro, de quem é irmão, Apolodoro, também presente. Posso citar muitas outras pessoas, uma das quais, de preferência, devia Meleto ter apresentado como testemunha da acusação; se então se esqueceu, faça-o agora, com minha licença, e diga se tem algum testemunho daquela natureza. Bem ao contrário, senhores, achareis todos prontos a acudir-me; a mim, o corruptor, que faço mal a seus parentes no dizer de Meleto e Anho. Talvez tivessem razões para me apoiar os corrompidos; mas os que não corrompi, já mais idosos, parentes daqueles, que motivo terão para apoiar-me, senão o reto e justo de reconhecerem que Meleto mente e eu digo a verdade?


---
Fonte:
Sócrates: vida e pensamentos. Editora Martin Claret. São Paulo, 1996.


Nenhum comentário:

Postar um comentário