quarta-feira, 29 de junho de 2016

Os comunismos que quiseram ser diferentes

Os comunismos que quiseram ser diferentes
Em 1955, para completar os acordos bilaterais existentes em matéria de Defesa e como resposta à integração da Alemanha Federal na O.T.A.N., a Albânia, a Tcheco-eslováquia, a Bulgária, a Polônia, a Romênia, a Hungria e a U.R.S.S. assinaram o Pacto de Varsóvia, ao qual se somaria a República Democrática Alemã. A ameaça contra um daqueles territórios "vinculava todos os outros, doutrina que a U.R.S.S. invocará sempre que tenha de fazer uso da intervenção.
Seria precisamente um recém-reabilitado quem salvaria a Polônia da intervenção soviética. As ânsias liberalizadoras dos intelectuais e de um importante setor do partido, as. dificuldades econômicas e o baixo preço que a U.R.S.S. paga pelo carvão polonês, a presença do marechal soviético Rokossovski à frente do Ministério da Defesa polonês, tudo dentro do espírito da destalinização e do exemplo de uma Jugoslávia reabilitada, fizeram com que a Polônia desencadeasse em poucos meses um movimento cujas consequências apenas a presença de Gomulka pôde conter, um Gomulka recém-saído do cárcere e apreciado por todos, menos pelos últimos stalinistas, na secretaria-geral do Comitê Central do partido. No verão de 1956 haviam eclodido violentos incidentes em Poznan. reprimidos sangrentamente pelas forças da ordem. A partir daquele momento endureceram os duros e liberalizaram-se os liberais. As posições eram irreconciliáveis, inclusive dentro do partido. Gomulka, o único interlocutor válido para os soviéticos que oferecia o país reabilitado em agosto, podia pôr em marcha o novo curso do socialismo polonês depois de 20 de outubro. Gomulka reconheceu que para chegar ao socialismo não havia necessidade de seguir, o caminho empreendidos pela U.R.S.S. e que outras vias, tal como a iugoslava. podiam ter resultados válidos, mas admoestava quem pretendesse aproveitar-se do novo processo de democratização. O campo recuou no processo de coletivizacão nos meses seguintes; segundo o princípio leninista da voluntariedade, empreendeu-se, uma reforma econômica e começaram a melhorar as relações com a Igreja. Pelo espaço de vários anos as estruturas polonesas seriam as mais abertas entre os. países do bloco socialista.
Na Hungria, o reformismo abriu caminho à contrarrevolução, que os tanques soviéticos reprimiram. Um stalinista, Gero, sucedeu a outro. Rakosi, em junho de 1956. A nova linha era representada pelo ex-primeiro-ministro Imre Nagy, até então votado ao ostracismo. Os intelectuais húngaros seguiam com atenção o processo polonês e reinava o descontentamento entre os trabalhadores. Em começos de outubro, Nagy apareceu em público junto da viúva de Rajk nos funerais do seu esposo, ex-ministro dos Assuntos Exteriores executado pelo stalinismo. Um centrista, Kadar, foi nomeado adjunto de Gero na secretria-geral. Em 23 de outubro, o socialismo reformista foi convocado pelos intelectuais para uma manifestação de solidariedade com os poloneses. Registraram-se os primeiros incidentes e proclamou-se a lei marcial. Vinte e quatro horas depois o reformista Nagy transformou-se no primeiro-ministro e o centrista Kadar passou a ocupar a secretaria-geral. As tropas soviéticas, que haviam penetrado em Budapeste, retiraram-se. Simultaneamente, estavam em marcha e confundidas entre si uma revolução reformista e uma contrarrevolução. O novo Governo era incapaz de controlar a rua: assalto a comissariados e instalações do partido, greve geral... A partir de 28 de outubro, a rebelião apresentava já um cariz marcadamente anticomunista. O cardeal Mindszenty, libertado, aparecia agora à frente dos insurretos que aspiravam ver restabelecido no país o reino de Santo Estevão. A reforma e a reação agitavam a mesma bandeira. Nagy cedeu às imposições da rua: anunciou o regresso ao sistema de partidos e chegou a denunciar o Patto de Varsóvia, proclamando a neutralidade da Hungria. O que Nagy mais desejava, neste momento, era voltar à situação de 1945, a um regime provisório. Em l de novembro, Janos Kadar separou-se de Nagy e dirigiu um apelo a Kruschev para que as tropas soviéticas restabelecessem a ordem. Três dias depois os tanques soviéticos entravam em Budapeste. A ordem ficava completamente restabelecida no país. Kadar seria o homem forte da nova situação. Nos próximos anos tentaria mitigar a dolorosa recordação de 1956, levando a cabo uma hábil política reformista não menos audaz que aquela que Nagy (executado pelos soviéticos em 1958) pretendia em princípio desenvolver. A partir de 1963, Kadar elevaria a lugares de responsabilidade homens que tinham lutado contra os tanques soviéticos nas ruas de Budapeste, recém-saídos das prisões, condenará a memória de Rakosi e de Gero e orientará o país na senda do bem-estar material.


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Fonte:
História Mundial desde 1939 (Biblioteca Salvat de Grandes Temas), por: José Pernau. Salvat Editora, 1979, págs.  99-102.

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