O grande Cisma e o nascimento da Igreja
Ortodoxa
Elemento
central da identidade nacional russa, o cristianismo ortodoxo nasceu do chamado
"Grande Cisma", de 1054. Nesse ano, o papa Leão IX excomungou o
patriarca de Constantinopla, Miguel Cerulário, que por sua vez excomungou o
pontífice romano.
Desde então,
surgiram dois cristianismos: o ortodoxo, que é mais "oriental", mais
"primordial", mais próximo das origens da religião; e o catolicismo,
que é mais "imperial" e europeu. Esses aspectos podem ser facilmente
observados na arquitetura, na arte religiosa e nas vestes dos sacerdotes e
religiosos de cada vertente. Os padres russos, por exemplo, usam compridas
batinas pretas, chapéus especiais e longas barbas. Além disso, a Igreja
Católica se deixou influenciar pela abordagem racionalista e individualista da
Renascença (séculos XV e XVI) e da "filosofia das Luzes" (século
XVIII), algo que não se verificou no cristianismo oriental. Em seu livro Remembering in a world of forgetting
(Lembrando em um mundo de esquecimento), o escritor britânico William Stoddart
traça um interessante paralelo entre as vertentes do cristianismo e do
is-lamismo: segundo ele, enquanto o catolicismo, mais "sóbrio" e
racional, pode ser comparado ao Islã sunita, a ortodoxia, mais mística, se
aproxima do xiismo.
A causa
teológica fundamental da separação entre católicos ocidentais e ortodoxos
orientais foi a questão do filioque:
enquanto os russos e gregos permaneceram fiéis ao estipulado pelo Concílio de
Nicéia (589), segundo o qual o Espírito Santo procede somente da primeira
pessoa da Trindade, os católicos introduziram, a partir do século VI, na
Espanha, a cláusula inovadora de que o Espírito procede do Pai e do Filho (filioque, em latim).
Outra discordância
diz respeito à autoridade religiosa. Os ortodoxos não aceitam a superioridade
do papa de Roma sobre os cinco outros patriarcas da Igreja Ortodoxa (de Moscou,
Constantinopla, Jerusalém, Antioquia e Alexandria). Para eles, o papa é primus inter pares ("primeiro entre
iguais"), mas não concordam que tenha a palavra final em questões
teológicas, morais ou disciplinares. Ele não poderia, por exemplo, ter imposto
o filioque ou o celibato sacerdotal a
toda a Igreja. Ao contrário dos sacerdotes católicos, os ortodoxos podem se
casar e ter filhos, e o celibato é restrito aos bispos e monges. No
cristianismo oriental, o divórcio é permitido por motivos graves, e rejeitado
pela doutrina católica.
Os ortodoxos
tampouco aceitam dogmas católicos como o da infalibilidade papal ou o da
existência do purgatório. No campo litúrgico, os cristãos ortodoxos seguem o
rito de são João Crisóstomo, e os católicos, o rito romano. O sinal-da-cruz
também é feito de forma diferente segundo a confissão: na ortodoxia, ele vai da
direita para a esquerda, simbolizando o fato de que o cristianismo nasceu no
Oriente e foi levado para o Ocidente - e também que Jesus surgiu entre os
judeus, mas sua mensagem foi absorvida pelos gentios. No sinal ortodoxo, três
dedos se juntam para representar a Trindade. No sinal católico o sentido é o
inverso e a mão está aberta, perdendo o simbolismo trinitário dos dedos.
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Fonte:
Revista História Viva. Ano 5 - Nº 53 - Março de 2002. Duetto Editorial. São Paulo, págs. 34-35.
Fonte:
Revista História Viva. Ano 5 - Nº 53 - Março de 2002. Duetto Editorial. São Paulo, págs. 34-35.
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